EUA tiveram acesso a conteúdo de ligações e e-mails, diz jornalista do 'Guardian'
Jornalista do "The Guardian" Glenn Greenwald
participa de audiência pública conjunta das comissões de Relações
Exteriores da Câmara e do Senado
Em audiência pública no Senado, o jornalista americano Glenn Greenwald, do jornal britânico "The Guardian", que
revelou ao mundo o programa de espionagem dos EUA,
disse nesta terça-feira (6) que há muitos documentos vazados que não
têm nenhuma relação com o terrorismo, mas dizem respeito à competição
industrial e a interesses comerciais do governo americano.
Segundo Greenwald, que publicou os dados revelados por Edward Snowden,
ex-técnico da agência de segurança americana (NSA), o governo americano
quer fazer crer que o seu programa se justifica para defender o país de
ações terroristas. "[Mas] Não tem nada a ver com terrorismo. É sabotagem
contra atos comerciais."
Greenwald descreveu os programas usados pelo governo americano e
afirmou ainda que o governo teve acesso ao conteúdo das mensagens
vazadas, e não apenas aos metadados (título e destinatário de emails e
números discados de ligações telefônicas, por exemplo), conforme
admitiu. "O governo americano teve acesso também ao conteúdo das
mensagens e das comunicações por telefone, e não só aos metadados."
O jornalista explicou que, por conta da grande quantidade de mensagens e
ligações telefônicas, o governo americano primeiro capta os metadados
de tudo e só invade o conteúdo daquilo que interessa.
"O governo americano tem capacidade para invadir o conteúdo dos
e-mails. Eles estão captando os metadados para então decidir quais
e-mails, quais ligações são interessantes para o governo americano.
[Quando dizem que só veem os metadados,] é o jeito mais limitado, mais
falso [de admitir a espionagem]. Têm não só a capacidade, mas usam
programas para invadir o conteúdo."
Segundo o jornalista, o esquema de espionagem começou no Afeganistão e
no Iraque na época em que esses países foram invadidos por tropas
americanas, em 2001 e 2003, respectivamente. No caso do Brasil, o país
teria virado foco das investigações americanas quando o ex-presidente
Lula resolveu, em 2010, intermediar, ao lado da Turquia, uma saída
negociada com o Irã sobre o seu programa nuclear.
Ele disse também que os EUA espionam a China há bastante tempo. "O
governo do Obama está reclamando há três, quatro anos da China que
estaria fazendo espionagem para ter vantagens comerciais, mas Snowden,
quando foi para Hong Kong, mostrou documentos que comprovam que os EUA
espionam a China há muito mais tempo para justamente ter vantagens
comerciais."
Uma das consequências mais graves do programa americano, disse, é que o
equilíbrio de poderes entre as nações fica comprometido, além de
interferir na privacidade das pessoas.
"O balanço do poder muda muito quando tem um Estado que consegue saber
tudo sobre outro Estado. Esse país vai ficar com muito mais poder",
afirmou, referindo-se aos Estados Unidos. "Quando a internet vira uma
ferramenta de controle, acho que o comportamento das pessoas muda e fica
mais restrito quando se sabe que está sendo monitorado."
Para ele,
Snowden foi um herói ao revelar o esquema. O jornalista disse ainda que mantém contato quase diário com o ex-técnico da NSA.
Sobre a postura do governo brasileiro diante da revelação do caso, ele
encara a reação pública mais forte do que a de fato tem acontecido nos
bastidores. "O Brasil está mostrando muito mais raiva em público.
Deveria ser mais enérgico para cobrar explicações dos Estados Unidos."
Como era o esquema
O jornalista afirmou também que o sistema de espionagem é muito
complexo, envolvendo em torno de 70 mil pessoas, o que torna difícil
controlar quem tem acesso a esses dados, como Snowden, que, segundo ele,
pegou "20, 25 mil documentos supersecretos". "O problema é, quando se
tem um sistema desse tamanho, é difícil controlar esse número grande de
pessoas."
O governo americano, através da agência de segurança NSA, utilizava programas secretos de interceptação de dados, como o Prism.
Alguns documentos foram vazados pelo ex-técnico da NSA, Edward Snowden, que, desde então, é procurado pelo governo dos EUA.
Snowden encontra-se agora em Moscou, na Rússia, com status de "refugiado". Os EUA negociam com o governo russo sua extradição.