O adiamento do balanço da Petrobras do terceiro trimestre do ano
passado foi um equívoco estratégico da direção da companhia, cada vez
mais vulnerável à pressão que vem recebendo de todos os lados, que
deveria, desde o início do processo, ter afirmado que só faria a baixa
contábil dos eventuais prejuízos com a corrupção, depois que eles
tivessem, um a um, sua apuração concluída, com o avanço das
investigações. A divulgação do balanço há poucos dias, sem números que não deveriam ter sido prometidos, levou a nova queda no preço das ações. E,
naturalmente, a novas reações iradas e estapafúrdias, com mais
especulação sobre qual seria o valor — subjetivo, sujeito a flutuação,
como o de toda empresa de capital aberto presente em bolsa — da
Petrobras, e o aumento dos ataques por parte dos que pretendem
aproveitar o que está ocorrendo para destruir a empresa — incluindo
hienas de outros países, vide as últimas idiotices do Financial Times -
que adorariam estraçalhar e dividir, entre baba e dentes, os eventuais
despojos de uma das maiores empresas petrolíferas do mundo. O que importa mais na Petrobras? O
valor das ações, espremido também por uma campanha que vai muito além
da intenção de sanear a empresa e combater eventuais casos de corrupção e
que inclui de apelos, nas redes sociais, para que consumidores deixem
de abastecer seus carros nos postos BR; à aberta torcida para que "ela
quebre, para acabar com o governo"; ou para que seja privatizada, de
preferência, com a entrega de seu controle para estrangeiros, para que
se possa — como afirmou um internauta — "pagar um real por litro de
gasolina, como nos EUA"? Para quem investe
em bolsa, o valor da Petrobras se mede em dólares, ou em reais, pela
cotação do momento, e muitos especuladores estão fazendo fortunas,
dentro e fora do Brasil, da noite para o dia, com a flutuação dos
títulos derivada, também, da campanha antinacional em curso, refletida
no clima de "terrorismo" e no desejo de "jogar gasolina na fogueira",
que tomou conta dos espaços mais conservadores — para não dizer
golpistas, fascistas, até mesmo por conivência — da internet.
Para
os patriotas - e ainda os há, graças a Deus - o que importa mais, na
Petrobras, é seu valor intrínseco, simbólico, permanente, e intangível, e
o seu papel estratégico para o desenvolvimento e o fortalecimento do
Brasil.
Quanto vale a luta, a coragem, a determinação, daqueles
que, em nossa geração, foram para as ruas e para a prisão, e apanharam
de cassetete e bombas de gás, para exigir a criação de uma empresa
nacional voltada para a exploração de uma das maiores riquezas
econômicas e estratégicas da época, em um momento em que todos diziam
que não havia petróleo no Brasil, e que, se houvesse, não teríamos,
atrasados e subdesenvolvidos que "somos", condições técnicas de
explorá-lo?
Quanto vale a formação, ao longo de décadas, de uma
equipe de 86.000 funcionários, trabalhadores, técnicos e engenheiros, em
um dos segmentos mais complexos da atuação humana?
Quanto vale a
luta, o trabalho, a coragem, a determinação daqueles, que, não tendo
achado petróleo em grande quantidade em terra, foram buscá-lo no mar,
batendo sucessivos recordes de poços mais profundos do planeta; criaram
soluções, "know-how", conhecimento; transformaram a Petrobras na
primeira referência no campo da exploração de petróleo a centenas,
milhares de metros de profundidade; a dezenas, centenas de quilômetros
da costa; e na mais premiada empresa da história da OTC - Offshore
Technology Conferences, o "Oscar" tecnológico da exploração de petróleo
em alto mar, que se realiza a cada dois anos, na cidade de Houston, no
Texas, nos Estados Unidos?
Quanto vale a luta, a coragem, a
determinação, daqueles que, ao longo da história da maior empresa
brasileira — condição que ultrapassa em muito, seu eventual valor de
"mercado" — enfrentaram todas as ameaças à sua desnacionalização,
incluindo a ignominiosa tentativa de alterar seu nome, retirando-lhe a
condição de brasileira, mudando-o para "Petrobrax", durante a tragédia
privatista e "entreguista" dos anos 1990?
Quanto vale uma
companhia presente em 17 países, que provou o seu valor, na descoberta e
exploração de óleo e gás, dos campos do Oriente Médio ao Mar Cáspio, da
costa africana às águas norte-americanas do Golfo do México?
Quanto
vale uma empresa que reuniu à sua volta, no Brasil, uma das maiores
estruturas do mundo em Pesquisa e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro,
trazendo para cá os principais laboratórios, fora de seus países de
origem, de algumas das mais avançadas empresas do planeta?
Por
que enquanto virou moda — nas redes sociais e fora da internet — mostrar
desprezo, ódio e descrédito pela Petrobras, as mais importantes
empresas mundiais de tecnologia seguem acreditando nela, e querem
desenvolver e desbravar, junto com a maior empresa brasileira, as novas
fronteiras da tecnologia de exploração de óleo e gás em águas profundas?
Por
que em novembro de 2014, há apenas pouco mais de três meses, portanto, a
General Electric inaugurou, no Rio de Janeiro, com um investimento de 1
bilhão de reais, o seu Centro Global de Inovação, junto a outras
empresas que já trouxeram seus principais laboratórios para perto da
Petrobras, como a BG, a Schlumberger, a Halliburton, a FMC, a Siemens, a
Baker Hughes, a Tenaris Confab, a EMC2 a V&M e a Statoil?
Quanto
vale o fato de a Petrobras ser a maior empresa da América Latina, e a
de maior lucro em 2013 — mais de 10 bilhões de dólares — enquanto a
PEMEX mexicana, por exemplo, teve um prejuízo de mais de 12 bilhões de
dólares no mesmo período?
Quanto vale o fato de a Petrobras ter
ultrapassado, no terceiro trimestre de 2014, a EXXON norte-americana
como a maior produtora de petróleo do mundo, entre as maiores companhias
petrolíferas mundiais de capital aberto?
É preciso tomar cuidado
com a desconstrução artificial, rasteira, e odiosa, da Petrobras e com a
especulação com suas potenciais perdas no âmbito da corrupção,
especulação esta que não é apenas econômica, mas também política.
A PETROBRAS teve um faturamento de 305 bilhões de reais em 2013, investe
mais de 100 bilhões de reais por ano, opera uma frota de 326 navios,
tem 35.000 quilômetros de dutos, mais de 17 bilhões de barris em
reservas, 15 refinarias e 134 plataformas de produção de gás e de
petróleo.
É óbvio que uma empresa de energia com essa dimensão e
complexidade, que, além dessas áreas, atua também com termoeletricidade,
biodiesel, fertilizantes e etanol, só poderia lançar em balanço
eventuais prejuízos com o desvio de recursos por corrupção, à medida que
esses desvios ou prejuízos fossem "quantificados" sem sombra de dúvida,
para depois ser — como diz o "mercado" — "precificados", um por um, e
não por atacado, com números aleatórios, multiplicados até quase o
infinito, como tem ocorrido até agora.
As cifras estratosféricas
(de 10 a dezenas de bilhões de reais), que contrastam com o dinheiro
efetivamente descoberto e desviado para o exterior até agora, e enchem a
boca de "analistas", ao falar dos prejuízos, sem citar fatos ou
documentos que as justifiquem, lembram o caso do "Mensalão".
Naquela
época, adversários dos envolvidos cansaram-se de repetir, na imprensa e
fora dela, ao longo de meses a fio, tratar-se a denúncia de Roberto
Jefferson, depois de ter um apaniguado filmado roubando nos Correios, de
o "maior escândalo da história da República", bordão esse que voltou a
ser utilizado maciçamente, agora, no caso da Petrobras.
Em
dezembro de 2014, um estudo feito pelo instituto Avante Brasil, que, com
certeza não defende a "situação", levantou os 31 maiores escândalos de
corrupção dos últimos 20 anos.
Nesse estudo, o "mensalão" — o
nacional, não o "mineiro" — acabou ficando em décimo-oitavo lugar no
ranking, tendo envolvido menos da metade dos recursos do "trensalão"
tucano de São Paulo e uma parcela duzentas vezes menor que a cifra
relacionada ao escândalo do Banestado, ocorrido durante o mandato de
Fernando Henrique Cardoso, que, em primeiríssimo lugar, envolveu,
segundo o levantamento, em valores atualizados, aproximadamente 60
bilhões de reais.
E ninguém, absolutamente ninguém, que dizia ser
o mensalão o maior dos escândalos da história do Brasil, tomou a
iniciativa de tocar, sequer, no tema — apesar do "doleiro" do caso
Petrobras, Alberto Youssef, ser o mesmo do caso Banestado — até agora.
Os
problemas derivados da queda da cotação do preço internacional do
petróleo não são de responsabilidade da Petrobras e afetam igualmente
suas principais concorrentes.
Eles advém da decisão tomada pela
Arábia Saudita de tentar quebrar a indústria de extração de óleo de
xisto nos Estados Unidos, aumentando a oferta saudita e diminuindo a
cotação do produto no mercado global.
Como o petróleo extraído
pela Petrobras destina-se à produção de combustíveis para o próprio
mercado brasileiro, que deve aumentar com a entrada em produção de novas
refinarias, como a Abreu e Lima; ou para a "troca" por petróleo de
outra graduação, com outros países, a empresa deverá ser menos
prejudicada por esse processo.
A produção de petróleo da
companhia está aumentando, e também as descobertas, que já somam várias
depois da eclosão do escândalo.
E, mesmo que houvesse prejuízo — e
não há — na extração de petróleo do pré-sal, que já passa de 500.000
barris por dia, ainda assim valeria a pena para o país, pelo efeito
multiplicador das atividades da empresa, que garante, com a política de
conteúdo nacional mínimo, milhares de empregos qualificados na
construção naval, na indústria de equipamentos, na siderurgia, na
metalurgia, na tecnologia.
A Petrobras foi, é e será, com todos
os seus problemas, um instrumento de fundamental importância estratégica
para o desenvolvimento nacional, e especialmente para os estados onde
tem maior atuação, como é o caso do Rio de Janeiro.
Em vez de acabar com ela, como muitos gostariam, o que o Brasil precisaria é ter duas, três, quatro, cinco Petrobras. É necessário punir os ladrões que a assaltaram?
Ninguém duvida disso.
Mas é preciso lembrar, também, uma verdade cristalina.
A Petrobras não é apenas uma empresa.
Ela é uma Nação.
Um conceito.
Uma bandeira.
E por isso, seu valor é tão grande, incomensurável, insubstituível.
Esta é a crença que impulsiona os que a defendem.
E, sem dúvida alguma, também, a abjeta motivação que está por trás dos canalhas que pretendem destruí-la.
• Mauro Santayana é jornalista e meu amigo.
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