Coisas da Política
Os carros e os tanquesMauro SantayanaSegundo
informações do governo, a balança comercial apresentou déficit de US$
1,350 bilhão na quarta semana de novembro. A balança comercial
apresentou exportações de US$ 4,151 bilhões e importações de US$ 5,501
bilhões. No acumulado do ano, a balança apresenta um déficit de US$
1,455 bilhão. Os dados se explicam pela queda na venda de produtos
manufaturados, mas também pelo aumento das importações, com destaque
para combustíveis e lubrificantes.
Enquanto isso, piora a
situação da Petrobras, com o adiamento, agora para esta semana, da
discussão sobre a implantação de um sistema de reajuste automático de
combustíveis, que ficou adiada para quinta-feira. Em meados deste ano, a
estatal tinha um prejuízo de 700 milhões de dólares por mês com a
importação de combustíveis, o que está sendo coberto com a venda de
ativos. E o governo resiste a mudar essa situação, com receio de criar
um novo indexador que poderia colocar em risco o controle da inflação.
Segundo
a ANP, apesar do saldo negativo no comércio de gasolina com outros
países, o país continua autossuficiente em óleo e derivados, já que as
exportações de petróleo bruto compensam as importações de petróleo leve,
e também da própria gasolina. Mas isso não resolve o problema das
trocas nacionais com o exterior. As exportações de manufaturados têm
caído, não apenas pela questão cambial, mas também devido aos efeitos da
crise internacional em outros países — principalmente da Europa e da
América do Sul.
O Brasil continua autossuficiente em óleo e derivados, mas as exportações de manufaturados têm caído
Cada
dólar economizado na compra de combustíveis no exterior evita a
necessidade de conseguir divisas para pagar essas importações, e
melhora, em consequência, a situação da economia nacional. O atraso na
construção das novas refinarias indica que não está próxima a solução
desse problema. Se tudo der certo, a Abreu e Lima, em Pernambuco, com
280 mil barris de capacidade, ficará pronta em 2014. Mas o Complexo
Petroquímico do Rio de Janeiro só entrará em produção em 2016, e as
refinarias do Maranhão e do Ceará, apenas em 2017 e 2018.
Considerando-se
a pressão da imprensa financeira internacional e das agências de rating
sobre o Brasil, em temas como o cálculo da dívida interna, o balanço de
pagamentos, e a questão fiscal, pode ser tarde demais.
Urge,
portanto, buscar a substituição de combustíveis importados por fontes
nacionais e, se possível, renováveis, para a frota de automóveis, que
cresceu aceleradamente nos últimos anos.
Enquanto importamos
gasolina, mandamos etanol para o exterior. Informações do setor de
açúcar e álcool dão conta de que as exportações desse combustível devem
continuar consistentes neste segundo semestre, favorecidas pelo câmbio,
com o dólar entre R$ 2,20 e R$ 2,30. No primeiro semestre, o Brasil
exportou 710 milhões de litros de combustível para os EUA, com
crescimento de mais de 100% ante o primeiro semestre do ano passado.
Um
dos caminhos que eventualmente poderiam ser trilhados seria achar uma
forma de subsidiar, marginalmente, a venda desse combustível no mercado
interno para que ele ficasse no Brasil, e se voltasse a investir no
aumento da produção. É mais barato, para o país, gastar reais para
aumentar a oferta de álcool nacional, do que arranjar dólares para
trazer gasolina do exterior.
Outra solução seria investir em
maior eficiência energética, e em outras fontes renováveis de origem
nacional. Na semana passada, o executivo brasileiro Carlos Ghosn,
presidente mundial do grupo Renault-Nissan, criticou publicamente a
demora nas negociações sobre a criação de uma política de incentivo para
carros híbridos e elétricos no Brasil.
Já que não dá para
aumentar a produção de combustíveis de um dia para o outro, é preciso
fazer com que os carros rodem mais quilômetros com menos combustíveis
fósseis ou possam, eventualmente, deles prescindir.
Ainda não se cogita mobilizar o consumidor para o uso de carros elétricos
Em
declarações para mais de uma centena de jornalistas de todo o mundo no
Salão Internacional de Tóquio, Ghosn declarou que há “falta de
interesse” do governo brasileiro para resolver a questão. Para ele,
apesar das declarações e da alusão à necessidade de menor emissão de
poluentes, não se cogita investir em uma rede de recarga de veículos ou
mobilizar o consumidor para o uso de carros elétricos.
O que
ocorre com a frota particular de automóveis também se estende para o
transporte público de passageiros. Nos programas de mobilidade
estabelecidos para a Copa do Mundo, não se programou o uso de ônibus
movidos a gás ou a etanol, quando isso já é comum em outras cidades do
mundo, e a tecnologia está amplamente disponível. Nem a adoção, ainda
que experimental, de ônibus a hidrogênio, como os desenvolvidos pela
Coppe do Rio de Janeiro.
Seria recomendável pensar sinergicamente
nessa questão, analisando todas as alternativas, para estabelecer uma
política nacional de combustíveis que leve em consideração as
características de cada região. Só assim poderemos começar a nos livrar
da dependência estrangeira e da ameaça de maiores déficits comerciais
nos próximos anos.
Mauro Santayana é jornalista e meu amigo.