No Uruguay não tem político rico, mas arremediados

Os políticos do Uruguai se orgulham da sua austeridade

A maioria dos candidatos presidenciais leva uma vida modesta


O presidente Mujica vota nas eleições primárias. / M. Campodonico (AP)
Com a substituição de José Mujica no comando da presidência do Uruguai, haverá, sem dúvidas, uma mudança em um estilo único de governar. Mas todos os candidatos eleitos no primeiro turno (senadores e deputados) deverão manter a austeridade que tanto chamou a atenção do mundo. Sem dúvida alguma, o ex-guerrilheiro tupamaro levou até a última instância o perfil discreto característico da política uruguaia. Mas passando em revista os presidenciáveis, da esquerda à direita, nenhum se projeta fora do campo da igualdade social, tão apreciada pelos uruguaios.
“Ninguém é melhor do que ninguém” é um dito popular que os uruguaios levam gravado em seu DNA e que Mujica colocou novamente na moda. Políticos e eleitores se projetam como parte de uma democracia social.
Nesse contexto, as declarações de bens dos candidatos, publicadas recentemente pelo jornal El Observador, indicam a modéstia com que os políticos enfrentam o acesso à liderança de seus partidos ou a chegada às instâncias máximas do poder. O líder da Frente Ampla, Tabaré Vázquez, principal favorito para as eleições presidenciais de hoje, em segundo turno, tem uma das melhores situações financeiras no grupo de presidenciáveis. Médico especialista em oncologia, recebe uma pensão como ex-presidente (cargo que ocupou de 2005 a 2010) que não passa de cerca de 5.875 reais, além de continuar exercendo a medicina, com uma renda média de uns R$5 mil  reais. Seu patrimônio total chega a pouco mais de um milhão de reais.
As origens humildes de Tabaré Vázquez o protegem de qualquer desconfiança, o que já não é o caso de Luís Lacalle Pou, o adversário.
Durante seu período como presidente, preferiu morar em sua própria casa, uma residência cômoda no bairro de El Prado, antiga região aristocrática de Montevidéu agora em decadência. Uma bandeira do Uruguai e um carro de patrulha policial eram os únicos sinais de que ali vivia um presidente. Mas mesmo essa modéstia chegou a escandalizar alguns setores da Frente Ampla, que consideravam como ostentação o fato de seu líder ter um estilo de vida de classe média alta, de médico com várias décadas de trabalho sobre os ombros.
As origens humildes de Tabaré Vázquez o protegem de qualquer desconfiança, o que já não é o caso do candidato surpresa do Partido Nacional (de centro-direita), Luís Lacalle Pou. Filho do ex-presidente Luís Alberto Lacalle, ele provém do que existe de mais parecido com uma aristocracia no Uruguai. Sua família tem dinheiro e, conforme demonstrou sua campanha, os que os apoiam também. Mas, aos 40 anos, Lacalle Pou apresenta a menor renda entre todos os candidatos presidenciais: um salário mensal de deputado de cerca de R$10 mil reais, um patrimônio de aproximadamente R$350 mil reais e muitas dívidas.
Sem dúvidas, aquele na lista que goza de melhor situação econômica é o líder do Partido Colorado (de direita), descendente de uma família de fazendeiros. Segundo declarou, Pedro Bordaberry,derrotdado no primeiro turno,  ex-ministro e filho do ex-ditador Juan María Bordaberry (1973-1976), possui um patrimônio de pouco mais de R$3 milhões de reais.
Mas para qualquer político do Partido Colorado, ser qualificado como rico ou milionário equivaleria a um insulto, já que a direita tradicional se considera sucessora do presidente José Battle y Ordóñez, fundador do Estado moderno e laico uruguaio no século XIX, e quem cunhou outra famosa frase: “que os ricos sejam menos ricos e os pobres menos pobres”.
Por isso, no Uruguai, um presidente ao estilo do chileno Sebastián Piñera – milionário, dono de um canal de televisão e de um clube de futebol, e com interesses em setores-chave da economia chilena – teria dificuldades em se apresentar a uma eleição, precisamente por encarnar todo o oposto da igualdade republicana.
Mais que a austeridade, a obsessão por não ostentar é uma característica geral dos uruguaios. Basta circular pelo bairro de Carrasco, o mais endinheirado de Montevidéu, para comprovar a contenção dos ricos em suas casas e mansões. No fim da década de oitenta e início da década de noventa, em plena febre de privatizações e dinheiro rápido em toda a América Latina, uma parte da direita uruguaia tentou aderir à mesma onda. Isso resultou em um plebiscito convocado por políticos e cidadãos de esquerda e direita em 1992. O referendo arrasou nas urnas com 71% dos votos destruindo os projetos de privatização de várias empresas estatais que continuam existindo hoje.
A batalha não foi apenas econômica: foi cultural e abriu um precedente. Nesse contexto, a corrupção dos políticos é pouco frequente e, mesmo no atual período pré-eleitoral, propício a todo tipo de acusações, uns e outros reconhecem a integridade de seus oponentes.
A senadora e esposa do presidente Mujica, Lucía Topolansky, afirmava estes dias que durante seu mandato “ninguém colocou dinheiro no bolso, e podemos pôr as mãos no fogo por todos que trabalharam”. A ex-guerrilheira diz que não se trata de uma característica particular de seu partido, mas sim “que faz parte do país”. “O Uruguai é como uma mata aberta. Vê-se tudo. [O político] está sob mais pressão. Se algum tem uma tentação, se vê mais pressionado”, disse.
Topolansky explicou por que é difícil ver um grande número de casos de enriquecimento ilícito no país: “Havia um velho dirigente sindical que dizia: ‘No Uruguai, não há ricos, há riquinhos’’, prosseguiu Topolansky. “Há algumas coisas que são próprias de um país mais aldeão: todos nós nos conhecemos e em cinco minutos de conversa descobrimos que temos algum amigo ou familiar em comum”.
Às vezes, a obsessão por não parecer perdulário provoca situações caricaturais, como o eterno debate sobre a compra de um avião presidencial. O Estado uruguaio poderia se permitir a esse luxo, mas nenhum governante parece disposto a pagar o preço político de tal aquisição. No caso de Mujica é simplesmente impensável, apesar de ser ele, com seus 79 anos, um dos mais prejudicados pelas seguidas viagens em voos de carreira, muitas vezes com escala.
Com Magdalena Martine´z e agencias

Pepe Mujica vai ser senador depois de eleger Tabaré presidente para o seu lugar



Venda de camisetas com o rosto de Mujica em Montevidéu. / AP

Montevideo - Uruguay - Especial - Um dos poucos prazeres que José Mujica pretende concretizar quando terminar seu mandato presidencial é visitar a cidade vasca de Muxica, na Espanha, de quase 1.500 habitantes. Foi de lá que partiu seu bisavô rumo ao Uruguai no século XIX. Mujica visitou a cidade pela primeira vez no ano passado e pretende regressar no ano que vem. Neste domingo, o Uruguai realiza eleições presidenciais que marcarão o fim de seu mandato, mas não de sua presença na política.
O candidato de esquerda, Tabaré Vázquez, de 75 anos, é o favorito em todas as pesquisas contra Luis Lacalle Pou, 41, do Partido Nacional, de centro-direita. O resultado será divulgado na segunda-feira, mas Mujica permanecerá na presidência até 1o de março, como determina a Constituição. Depois disso, continuará vivendo em seu pomar e não ficará de braços cruzados. A Frente Ampla, seu partido e o de Tabaré Vázquez, sabe que “el Pepe” é a máquina mais poderosa para ganhar votos e não pretende desperdiçá-la.



Uma pessoa muito próxima a Mujica o descreve assim: “É um animal político, incansável como um desses velhos que consertam uma cadeira, depois uma mesa, o armário, voltam à cadeira e seriam capazes de quebrá-la para poder consertá-la de novo”. Tem 79 anos, nove a mais que sua esposa, a também ex-guerrilheira dos Tupamaros, Lucía Topolansky. Ambos trabalharão juntos durante os próximos cinco anos como senadores da Frente Ampla. “El Pepe”, diz a esposa, “vai cumprir um grande papel como mediador no Senado. Porque é um grande negociador. Já perdi a conta de reuniões feitas em nossa casa com sindicalistas, professores, agricultores, vizinhos, generais, ministros... E o Senado vai ter seu soldado mais fiel, que eu sempre fui. Já coincidimos em uma legislatura como senadores.”
Dentro dos 27 grupos que integram a Frente Ampla, apenas sete têm um peso importante, como o Partido Socialista e o Comunista. Mas a legenda que tem conseguido mais votos nas legislativas nos últimos dez anos é a de Mujica, que é apoiado por três de cada dez eleitores da Frente. Seu nome oficial é Movimento de Participação Popular (MPP), mas entre piadas costumam chamar o partido de Movimento do Pepe.
Além do Senado, Mujica está criando uma escola de formação agrária em sua casa. “Nós temos um terreno de 14 hectares e meio”, diz Topolansky. “Em uma pequena parte cultivamos nossas flores, frutos e verduras. E agora criamos uma fundação para formar as pessoas. Hoje uma pessoa não pode subir em um trator que custou 80.000 dólares sem saber como funciona. E não serve de nada semear frutos e depois não saber como cuidar deles. No dia de amanhã, se tiverem que lembrar de nós por algo no bairro, que seja como uns velhos loucos que fundaram uma escola e doaram o terreno em sua morte.”



Mas o Senado, a escola agrária, a viagem à cidade de Muxica e as conferências no exterior talvez não sejam ocupações suficientes para saciar toda sua energia. Por isso, Mujica também se dedicará a “respaldar seus frangos”, quer dizer, apoiar os candidatos do MPP nas eleições municipais que serão realizadas no Uruguai em maio de 2015. As negociações internas da Frente são formadas em um universo de equilíbrio e concessões no qual Mujica se movimenta com perfeição. Mas, mesmo ele, com todo seu carisma e poder como presidente, sofreu fortes derrotas em mais de uma ocasião.
À medida que se aproxima o final de seu mandato, Mujica conseguiu melhorar sua imagem positiva em dez pontos, de 54% a 64%. “Em um mundo onde a política está cada vez mais desprestigiada”, diz sua esposa, “ele soube ganhar prestígio. Por que um presidente tem que viver de forma diferente a um cidadão comum de seu país? Não há nenhuma razão política, social nem jurídica. Isso é um resquício da monarquia.”
Muitos empresários e políticos da oposição reconhecem em público que se hoje há como explicar no mundo que o Uruguai não é o Paraguai, é graças ao Pepe. Em outubro de 2011, quando já cumpria dois anos de mandato como presidente, Mujica foi a um evento oficial em Hamburgo. Uma testemunha lembra que a tradutora o apresentou em três ocasiões como presidente do Paraguai, até que o próprio ministro de Relações Exteriores alemão a interrompeu para corrigi-la. Provavelmente, o senador Mujica não enfrentará nunca mais esse constrangimento.

Somos cada vez menos.


Marcha do Orgulho Hétero reúne cerca de 20 pessoas no Rio

Grupo caminhava na orla da Zona Sul em direção ao Arpoador.
'Héteros unidos jamais serão extintos' estava escrito em uma das faixas.


Marcha do Orgulho Hétero reúne poucas pessoas na Zona Sul do Rio (Foto: Eduardo Vallim/G1) 
Marcha do Orgulho Hétero reúne poucas pessoas na Zona Sul do Rio (Foto: Eduardo Vallim/Ego)

Olhar 33


A desinibida senhora é mulher do goleiro Tim Howard, da seleção dos Estados Unidos.

Capa do jornal El Pais, de Montevideo - Uruguay


A leitura dos jornais (El País da Espanha)


'El País': Cuba converge com Europa sem se aproximar dos EUA

Washington exige de Havana abertura política e não apenas medidas econômicas liberalizantes


"Nenhum dos ministros e mensageiros estrangeiros recebidos por Raúl Castro nos últimos anos — o titular das Relações Exteriores espanhol José Manuel García-Margallo esteve na ilha esta semana, mas não foi recebido pelo governante — teve indicações de que serão realizadas iniciativas oficiais nessa direção.
Enquanto isso, assim como durante a presidência de José María Aznar — correia de transmissão na Europa das políticas de endurecimento patrocinadas por George W. Bush para desencadear revoltas populares —, o governo de Barack Obama também quer aproveitar as relações fluidas entre Madri e Havana, mas em outro sentido. Faz isso para somar-se ao relaxamento latino-americano e europeu, buscando influir em seu desenvolvimento", prossegue o artigo do El País.
"Ao contrário de Bush, Obama não promove uma insurreição geral na maior das ilhas do Caribe porque as consequências seriam graves, mas tampouco renuncia a operações encobertas que estimulem descontentamentos sociais ou suficientemente intensos com o objetivo de obrigar o governo cubano a ceder poder. Acostumado à resistência, o regime mantém sua posição. No entanto, a belicosidade dos Estados Unidos perde espaço político porque a UE tem problemas mais importantes do que se envolver em uma cruzada contra o comunismo caribenho. E porque a América Latina, quase em bloco, é mais partidária de integrar a ilha em todos os fóruns democráticos regionais do que de “empurrar” para que se produzam mudanças democráticas em Cuba.
A esquerda e a social-democracia governam do Rio Grande à Terra do Fogo, e o embargo e o radicalismo dos EUA com Havana comprometem sua relação com o resto da América Latina.
O México quer recuperar sua influência histórica na estratégia ilha, debilitada durante a convergência com Washington na política externa dos Governos do conservador Partido Ação Nacional (PAN)", diz a matéria.
Como anfitrião da próxima Cúpula Ibero-americana em Veracruz, o México compensou 70% da dívida cubana para ganhar posições na classificação de sócios comerciais e políticos de Cuba e tentar se aproximar do Brasil, à frente de Colômbia e Argentina. A Venezuela lidera a relação dos aliados de Cuba. “Esperamos que se a UE assinar o acordo de cooperação política conosco, e depois do que está vendo na América Latina, Obama afrouxe um pouco”, diz um membro do Partido Comunista de Cuba (PCC), convencido de que a conjuntura internacional não favorece a continuação das políticas de isolamento e castigo historicamente aplicadas por Washington. “Já sabemos que a suspensão do bloqueio depende do Congresso, mas Obama pode fazer outras coisas, como por exemplo permitir que os norte-americanos possam viajar para Cuba”.

Opinião

O Congresso e a desnacionalização do mercado aeronáutico brasileiro

Mauro Santayana
Acordo “costurado” no Senado, permitiu a aprovação, em comissão especial, de medida provisória que prevê subsídios à aviação regional, da forma como pretendia a Azul Linhas Aéreas. Isso evitou que o projeto viesse a beneficiar, indiretamente, fabricantes estrangeiros de grandes aviões, como a Boeing e a Airbus, e ajudou a indústria brasileira, por meio da Embraer, que, no entanto, adquire boa parte das peças de suas aeronaves no exterior.
A surpresa ficou por conta de uma alteração feita de última hora no texto, aprovando a compra de até 100% do capital de companhias de aviação brasileiras por estrangeiros, indo contra o que se pratica em boa parte do mundo. Se nossas grandes empresas, como a Gol, forem totalmente desnacionalizadas, o que ocorrerá quando gerentes norte-americanos ou europeus começarem a destratar funcionários nacionais de companhias aéreas aqui adquiridas, ou fizerem o mesmo com  viajantes brasileiros em nossos aeroportos? Ou se a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) ou as autoridades do governo federal tiverem suas regras contestadas, e forem processadas em tribunais de Atlanta ou Forth Worth, onde ficam situadas sedes de empresas estrangeiras, quando tentarem fazer valer sua autoridade, ou tomarem alguma decisão que contrarie, eventualmente, interesses de grupos como a Delta e a American Airlines?
Isso, sem falar de outros riscos, ligados à segurança nacional,  como a entrada clandestina de pessoal ou de equipamento não autorizado de outras nações em nosso território, caso a maioria das ações — e o comando de nossas companhias de aviação — venha a ficar em mãos estrangeiras, como se pretende, sem a exigência, ao menos, de uma maioria de capital nacional.
Mas, o pior de tudo é a cabotinice, a cessão apressada de vantagens, com o mais absoluto desprezo pelos critérios de isonomia e reciprocidade. Nem na Europa, nem nos Estados Unidos, empresas estrangeiras de aviação — incluídas as brasileiras — podem voar no mercado doméstico, e está vedado ao capital estrangeiro o controle de companhias locais de aviação. Na União Europeia, empresas de fora desse grupo de países não podem adquirir mais de 49.9% das ações. E nos EUA, toda uma legislação protege o mercado com a intenção expressa de “garantir a proteção dos consumidores e dos empregos nos Estados Unidos".
Enquanto isso, no Brasil, queremos abrir, graciosamente, com uma canetada, aquele que já é o segundo maior mercado do mundo em número de aeroportos, e será, segundo a Iata (Associação Internacional de Transportes Aéreos), depois dos EUA e da China, o terceiro maior mercado doméstico do planeta, em 2017, daqui a apenas três anos, sem exigir absolutamente nada em troca.
O mercado brasileiro de aviação passou de 37,2 milhões de passageiros de avião em 2003 para mais de 100 milhões em 2012 — 88,7 milhões deles transportados em voos domésticos e 18,5 milhões nas rotas internacionais. O número alcançado em 2012 representou uma proporção de 55 passageiros transportados no modal aéreo para cada 100 habitantes no Brasil, enquanto que em 2003 essa mesma proporção era de 21 para 100.
É esse gigantesco negócio, com um enorme potencial de lucro e crescimento, que estamos entregando, de mão beijada, aos estrangeiros. Isso, caso não seja vetado o dispositivo apresentado, ontem, pelo relator da MP 652, o senador Flexa Ribeiro, do PSDB do Pará, que revoga a parte do Código Brasileiro de Aeronáutica,  que exige que ao menos quatro quintos do capital votante das companhias aéreas instaladas no Brasil pertençam a nossos cidadãos.

Mauro Santayana e jornalista e meu amigo.