
Renata Malkes
Numa operação logística que surpreendeu pela rapidez, os primeiros 12 presos políticos libertados no fim de semana pelo governo cubano chegaram ontem a Havana, onde passam por exames médicos e trâmites legais para deixar a ilha rumo à Espanha.
A embaixada espanhola deve terminar hoje a emissão dos vistos de entrada para os dissidentes e para cerca de uma centena de familiares que os acompanharão ao exílio.
Especula-se ainda que os primeiros cubanos poderiam embarcar ainda nesta noite, num gesto visto como uma tentativa do governo de retomar relações econômicas com a União Europeia.
Até a tarde de ontem, pelo menos dez dos 17 dissidentes que viajarão à Espanha já estavam sendo submetidos a exames médicos no Hospital Penal Combinado del Este, em Havana.
Os parentes dos prisioneiros foram levados a uma unidade militar do Ministério do Interior, no distrito de Valle Grande, na capital, para aguardar a viagem, mas, segundo fontes cubanas, o reencontro familiar só será possível no avião.
Segundo Laura Pollán, líder do movimento Damas de Branco — que reúne familiares de opositores políticos presos em Cuba desde 2003 —, 26 dos 52 prisioneiros políticos anistiados já foram informados e questionados sobre uma eventual viagem à Espanha.
Desse grupo, 20 teriam aceitado o exílio e outros seis manifestaram o desejo de permanecer na ilha.
A rapidez do traslado de prisioneiros e familiares após a conclusão das negociações — intermediadas pela Igreja Católica e pelo chanceler espanhol Miguel Ángel Moratinos — para a soltura de 52 dos 75 dissidentes presos desde 2003 na chamada "Primavera Negra" surpreendeu os cubanos.
Para o jornalista opositor Reinaldo Escobar, não estão claros os reais motivos do regime. Ele acredita que será preciso esperar até o próximo dia 26 — quando o presidente Raúl Castro faz o tradicional discurso pelo aniversário da revolução em Santa Clara — para compreender a estratégia do governo comunista. Mas adverte: a aparição pública de Fidel Castro na semana passada, a primeira em quatro anos, é uma advertência aos cubanos.
— Não sabemos como ou por que foi tudo tão rápido nas negociações. Mas o fato de que Fidel apareceu neste momento é sintomático. Ele quer dizer que está vivo, que os ideais da revolução estão vivos e que tudo está sob controle — disse Escobar ao GLOBO, por telefone.
— Basta dizer que a visita dele aconteceu no dia 7 e somente após o acerto das libertações, no dia 11, esse fato foi divulgado. Temos que dizer-lhe que as medidas não são suficientes. Ainda há gente na cadeia. E a liberdade deve ser para todos — criticou.
Para analistas, a decisão repentina do governo de Havana pode ser interpretada como um recado ao presidente Barack Obama, em Washington.
Acredita-se que o sucesso da intervenção espanhola nas negociações seja usado por Havana como uma prova de confiabilidade e de sua abertura às mudanças.
A iminência de um colapso econômico na ilha — que precisa importar 70% do que consome — faz o governo Castro ter interesse imediato em restabelecer relações políticas e econômicas com a União Europeia.
A libertação dos dissidentes seria uma prova de que o país está disposto a repensar a questão dos direitos humanos — como exigem os americanos — e de que está disposto a negociar para suspender o embargo econômico à ilha.
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