Lula: Vitória de Dilma será ‘a redenção das mulheres’
Acompanhado de Dilma Rousseff, Lula escalou nesta segunda-feira (11) o primeiro palanque do segundo turno.
Deu-se num comício realizado em Ceilândia, cidade-satélite de Brasília. O repórter acompanhou o evento ao vivo, via web.
A composição do palco foi caracterizada pelo ecletismo. Sobre o estrado, por exemplo, Michel Temer, presidente do PMDB e vice de Dilma.
A uma distância regulamentar, Ciro Gomes (PSB), aquele que chamou o PMDB de “ajuntamento de assaltantes” e Temer de “chefe dessa turma”.
Ciro refugiou-se no fundo do palanque. Passaria incógnito, não fosse a inconveniência de Lula. O presidente perguntou à platéia: “Tem cearense aqui?”. Ergueram-se vários braços.
E Lula, puxando o novo coordenador do comitê de Dilma para a boca do palco: “Tá aqui o Ciro Gomes, que apoia o Agnelo [Queiroz, candidato do PT ao governo do DF] e a Dilma”.
Lula pediu votos, primeiro, para Agnelo. Disse que Brasília já experimentou “boas experiências” administrativas e “experiências ruins”. Achegou-se ao ex-petista Cristovam Buarque, hoje senador reeleito pelo PDT: “O Cristovam foi uma experiência muito bem sucedida quando foi eleito governador da nossa Capital”.
Aqui, vale a pena abrir um parêntese. Primeiro titular do Ministério da Educação da era companheira, Cristovam foi demitido quando cumpria missão no exterior. A despeito de carregar na biografia a “experiência bem sucedida”, o senador foi mandado ao olho da rua pelo telefone. Fecha parêntese.
Depois de Cristovam, disse Lula, Brasília só experimentou desastres. “Tivemos pessoas reeleitas duas vezes [Joaquim Roriz]. O último governador [José Roberto Arruda], com quem trabalhamos por quatro anos, a gente jamais esperava que acontecesse o que aconteceu”.
Mais adiante, emendou: “O povo de Brasília está cansado de ver fotografias e reportagens de deputados e governantes levando propina, enquanto o povo continua passando necessidades e de privações. Mais que ser governador, Agnelo, você tem que ser o moralizador de Brasília”.
Abra-se, por inevitável, outro parêntese. O “moralizador” Agnelo carrega em sua chapa, como candidato a vice-governador, o deputado Tadeu Filipelli (PMDB). Entre fevereiro de 1999 e fevereiro de 2001, Filipelli foi secretário de Obras do “desastre” Joaquim Roriz. Fecha parêntese.
No pedaço final do discurso, Lula pediu votos para sua pupila: “Conheço a Dilma como conheço o adversário dela [José Serra] há muito tempo. Não tenho dúvida de que ela é muito mais competente que seu adversário”.
Escaldado, Lula alertou: “A gente não pode achar que tem eleição ganha antes do dia. [...] Se a gente começa a cantar vitória antes do tempo acontece o que aconteceu com Corinthians e o Fluminense...”
“...A gente achava que ia ser campeão. E tá perdendo uma [partida] atrás da outra. O meu Curingão perdeu oito pontos em uma semana!”
Lula convidou os militantes que o ouviam a fazer uma pergunta aos seus próprios botões. “Que diabo, esse Lula, com tanto macho perto dele, por que foi escolher uma mulher pra ser presidente da República?”.
Prosseguiu: “Eu poderia ter escolhido um deputado, um senador, um governador. Por que a Dilma?” Antes de responder, Lula divagou: “Quando cheguei no Congresso, em 1987, não tinha banheiro pra mulher...”
“...Mulher não podia andar de calça comprida dentro do Congresso e no Judiciário. Esse país foi feito pra nós, machistas, homens. E as mulheres se cansaram disso”. Elas “querem agora participar em igualdade de condições. Essa é a grande conquista dessa eleição”.
Ao lado da primeira-dama Marisa Letícia, Lula esmiuçou o raciocínio: “A gente vai olhar pra nossa companheira mulher e não vai dizer que gosta dela porque ela vai lavar as panelas. A gente vai dizer que gosta dela e por isso a gente vai lavar as panelas pra ela”.
Só então, o cabo eleitoral respondeu à pergunta que formulada parágrafos antes: “A Dilma vai começar a rendeção das mulhres no Brasil e no mundo. Pra isso ela precisa ser eleita presidente da República".
A “redentora das mulheres do Brasil e do mundo” havia discursado antes de seu patrono. Soou confiante na vitória. Por quê? “O Brasil não é caranguejo que volta pra trás”. Avisou: “Vamos escutar ainda muitos boatos".
"Meu adversário faz uma campanha baseada no ódio, na boataria, na calúnia, na mentira e na falsidade. Ele não acusa de frente, olho no olho, não faz a disputa justa, leal e verdadeira...”
“...Usa de artifícios para atacar o projeto que ele sabe que é diferente do dele. Um projeto generoso, que mudou vida das crianças, dos jovens, dos adultos e dos idosos desse país. Não somos mais um país de joelhos”.
Serra responde à acusação de Dilma com um ‘trololó’
A realidade da campanha eleitoral por vezes confere ao Brasil uma aparência de país irreal –espécie de romance de Cabral, com prefácio de Caminha.
José Serra, um dos protagonistas, esteve em Goiânia nesta segunda (11). Carregava atrás de si um par de dúvidas.
Ambiguidades resultantes de provocações feitas na véspera por Dilma Rousseff, a outra personagem do enredo sucessório.
No debate da TV Bandeirantes, Dilma levou aos holofotes dois nomes: Mônica Serra e Paulo Vieira de Souza.
Sobre a primeira, declarou: “Sua esposa, Mônica Serra, disse: ‘A Dilma é a favor da morte de criancinhas’. Acho gravíssima a fala da sua senhora”.
Quanto ao outro, Dilma afirmou: “Você deveria responder sobre Paulo Vieira de Souza, seu assessor, que fugiu com R$ 4 milhões de sua campanha”.
Em ambos os casos, Serra fingiu-se de morto no debate. Não se animou nem mesmo a sair em defesa de sua mulher.
Pois bem. Na passagem pela capital de Goiás, Serra viu-se compelido a dizer meia dúzia de palavras sobre o embate da Bandeirantes.
Declarou-se surpreso com a agressividade de Dilma. Com atraso, reportou-se à menção feita por sua rival a Mônica Serra:
"Ataque à família não é bom na campanha. Campanha é para discutir propostas, comparar candidatos, o que eles fizeram, o que vão fazer".
Absteve-se de esclarecer o teor da "gravíssima fala da sua senhora". Coisa pronunciada no mês passado, num corpo-a-corpo em Nova Iguaçu (RJ). Uma pena.
Tão grave quanto o “ataque à família” é a retórica da “morte de criancinhas”. A mulher de Serra, por ilustrada, decerto não ignora o significado de uma apelação.
Quanto a Paulo Vieira de Souza, um ex-gestor de obras do governo de São Paulo conhecido como Paulo Preto, Serra disse o seguinte:
"Eu não sei quem é o Paulo Preto. Nunca ouvi falar. Ele foi um factóide criado para que vocês [repórteres] fiquem perguntando".
Curioso, muito curioso, curiosíssimo. Serra empregou o mesmo vocábulo que Dilma usara ao comentar pela primeira vez o ‘Erenicegate’: “Factóide”.
É improvável que Serra desconheça Paulo Preto. Até abril deste ano, ele ocupou um posto estratégico do governo de São Paulo: diretor de Engenharia da Dersa.
Na gestão do governador Serra, o homem que o candidato Serra diz ignorar cuidava das grandes obras rodoviárias do Estado. Entre elas o Rodoanel.
Ex-chefe da Casa Civil de Serra, Aloysio Nunes Ferreira, agora senador eleito por São Paulo, mantém com Paulo Preto relações de amizade.
Ao tratar como “factóide” o sumiço de R$ 4 milhões supostamente coletados para nutrir as arcas de sua campanha, Serra desrespeita o eleitor.
Se verdadeiro, o episódio mereceria do candidato ao menos uma declaração protocolar em favor da investigação.
Se inverídica, a acusação de Dilma, recolhida de notícias penduradas nas manchetes, justificaria uma reação indignada.
O silêncio de Serra autoriza a rival petista a mimetizar a pergunta que o tucanato fazia em relação ao R$ 1,7 milhão do dossiê dos aloprados petistas de 2006.
Os grã-tucanos gostavam de inquirir: “De onde veio o dinheiro?”. O petismo está liberado para indagar: “Para onde foi a grana?”
Serra percorreu as ruas de Goiânia em carreata. Além de políticos, o candidato tinha a seu lado um padre.
Chama-se Genésio Ramos. Comanda a Paróquia de São Francisco de Goiás, assentada na cidade de Anápolis.
Padre Genésio presenteou Serra com um terço. Diante de uma multidão estimada pela PM em 5 mil pessoas, o candidato beijou o adereço (repare na foto lá do alto).
Ao discursar, Serra declarou: "Nós estamos movidos pela fé. A fé de dentro da gente, a fé que vai construir o Brasil".
No Brasil irreal –aquele país do romance de Cabral, prefaciado por Caminha— a fé constrói qualquer coisa.
No país cuja realidade é tinada pela dúvida, exige-se algo mais dos pretendentes à cadeira de presidente da República.
Para utilizar uma gíria ao gosto de Serra, não fica bem para um candidato contrapor a uma grave acusação da adversária uma resposta alicerçada em mero trololó.
Do blog do josias de souza
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