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Fotografia é história - Ulysses: 6/10/1992


Em todo momento a gente vê a velha e já gasta discussão: uma imagem vale tanto quanto mil palavras. Discordo inteiramente. Primeiro, acho que depende da imagem e também depende das palavras. Segundo, não escrevo intrinsecamente sobre a foto em questão. Abordo algo que está fora dela, as condições em que foi feita e não simplesmente uma descrição automática da imagem. É interessante dizer dos lances inerentes ao seu conteúdo. Esta, por exemplo – que fiz uma semana antes da morte de Ulysses Guimarães – tem uma história que reputo curiosa.
Como foi - Sempre fiquei preocupado com o caráter premonitório de algumas fotos que fiz. Mas esta de Ulysses tirou-me o sono por várias noites. O dia 6 de outubro de 1992 foi daquelas terças-feiras de pouco movimento no Congresso. No fim da tarde, quando eu voltava para a redação da Veja e descia a escada do Salão Verde da Câmara para o térreo, reparei que a luz do outono brasiliense estava como sempre majestosa. O sol, na altura do horizonte, invadia o andar térreo com uma réstia de raios cristalinos. Minha saída coincidia com a chegada do doutor Ulysses. Ele parou em frente do elevador privativo aos parlamentares para responder a uma pergunta do jornalista Ivanir Bortot, à época da Gazeta Mercantil. Do lugar onde eu estava, no contra-luz, via a silhueta de Ulysses e Bortot, ambos contornados pelos raios de luz. Quatro fotogramas. Confesso que o resultado da imagem me impressionou. Era forte, não tinha a ver com a serenidade daquele momento. Seis dias depois, a trágica notícia do desaparecimento de Ulysses. Constatada sua morte, evidentemente, virou capa da revista. Falei com Mário Sérgio Conti, editor-chefe àquela época, recomendando que resgatasse em São Paulo o tal cromo. Aquela imagem que tanto me chamou a atenção foi para a capa da revista. Depois virou monumento em uma cidade de São Paulo. Impressionante. Doutor Ulysses nasceu em dia 6 de outubro. Justamente no dia em que fiz a foto que prenunciava sua morte.
Orlando Brito.

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