NOITE DE S. BARTOLOMEU
Roberto Victor Pereira Ribeiro - Presidente da Academia Cearense de Direito
No
passado, em meio a nublada Era dos séculos XV a XVIII, era comum haver
uma noite no ano dedicada à alforria, à devassidão, à violência, à
imoralidade, em suma, a tudo que durante os outros 364 dias/noites do
ano eram abomináveis e inadequados socialmente.
Neste
período era comum encontrar monarcas bêbados em tavernas, mulheres da
realeza fornicando com homens plebeus em plena rua, hordas de homens
estuprando mulheres ao bel-prazer, desavenças sendo resolvidas a base de
espadas e machados, invasões a propriedades alheias, dentre outras
práticas avessas à vida em comunidade.
Foi
também nos dias inquietos e cinzentos do século XVI, mais precisamente
em 1572, que ocorreu uma das noites mais violentas registradas na
história da humanidade: a famigerada “Noite de São Bartolomeu”. Essa
noite ficou para sempre marcada no registro histórico-antropológico
devido ao alto índice de violência acontecida. Em uma nítida
intolerância religiosa milhares de pessoas foram assassinadas das formas
mais perversas imaginadas pelo homem racional. A História relata que a
quantidade de cadáveres arremessados nos rios era tamanha que
visivelmente se enxergava uma contaminação na água, de modo que ninguém comia peixe, ninguém tomava banho, tampouco
suportava o cheiro próximo ao local. Por conta dessas razões
insalubres, outros milhares morreram por fome, sede, falta de higiene
mínima para sobrevivência, além de doenças virais e bacterianas que se
proliferaram por conta dos cadáveres expostos ao vento.
Há dois meses Hollywood lançou para o mundo uma película intitulada: The Purge,
traduzindo para o nosso vernáculo: “Uma noite de crime”. O enredo do
filme traz o acro sabor da violência praticada por todos os habitantes
da Terra em uma noite escolhida no ano. Nesta noite tudo era permitido,
sem que o Estado pudesse zelar através de sanções. Não havia leis, não
havia autoridades, não havia regras ou condutas morais e éticas, tudo
era permitido.
Em
ares de recência, sob o intervalo de apenas um crepúsculo, assisti a
poucos metros de mim três assaltos com formatos extremamente violentos e
ensandecidos. Neste momento, onde ora estou à frente do meu computador – no passado com certeza estaria diante de uma Royal, Olivetti, Remington ou outras – pergunto a mim e
a você caro leitor: será que estamos vivenciando em nosso país, o tão
querido e amado solo brasileiro, todas as manhãs, tardes e noites, as
antigas noites de São Bartolomeu? A realidade de “noites de violência”? A
condescendência das antigas noites onde pessoas praticavam o avesso do
avesso em plena sociedade?
Será,
caro leitor, que assistimos uma total falência do Estado brasileiro no
que concerne à segurança, à educação e à prevenção de crimes?
Respondo.
A cada 60 (sessenta) minutos morre uma pessoa no Brasil e a cada 15
(quinze) minutos uma pessoa é violentamente assaltada. É, infelizmente,
vivemos dias, tardes e noites de São Bartolomeu. Reage sociedade
brasileira.
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