CPI: Especialistas alertam que juros acumulados na concessão de crédito chegam a 1000%
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Sob
a relatoria do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), a Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Cartões de Crédito ouviu nesta
quarta-feira (9), no Senado, representantes de
consumidores e lojistas convidados à primeira audiência pública
realizada pelo colegiado. De acordo com especialistas, os juros
acumulados na concessão de crédito no país chegam a 1000% ao ano.
“Apesar de o Brasil registrar a menor taxa básica (Selic), que
está em 6,5% ao ano”, observou o diretor de Relações Institucionais e
Mídia da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste),
Henrique Lian.
Ao
concordar com a opinião de uma participante ao debate na CPI, cujo
questionamento foi encaminhado por email à comissão, o senador Fernando
Bezerra
destacou que o papel do colegiado é entender o porquê da cobrança de
juros tão elevados e apresentar soluções que atendam as demandas da
população. “Não é possível o país continuar convivendo com juros
abusivos e extorsivos”, afirmou o vice-líder do governo
no Senado. “É verdade que, conforme salientou a participante, taxas
para determinada fração de produtos bancários estão mesmo mais altas que
os juros cobrados por agiotas, que é crime”, acrescentou Bezerra
Coelho.
Além
do representante da Proteste, participaram da audiência pública de hoje
– presidida pelo senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) – o presidente da
União Nacional das Entidades de Comércio e Serviço (Unecs), Paulo
Solmucci; o economista e acadêmico Maurício Amaral Lima; e o advogado do
Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Igor Rodrigues
Britto. A CPI também convidou o Instituto de Desenvolvimento
do Varejo (IDV), que não enviou representante para este debate.
SOLUÇÕES
– Tanto os especialistas quanto o senador Fernando Bezerra Coelho
avaliaram que o enfrentamento à chamada “verticalização bancária” (priorização
de clientes de renda mais alta) e o aumento da concorrência no
sistema financeiro são necessários para a redução dos juros aos
usuários. De acordo com o Idec, em 2008, dez bancos concentravam o maior
volume do crédito no país. Atualmente, cinco instituições
respondem por 80% dos serviços, incluindo cartão de crédito e cheque
especial: Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa Econômica
Federal.
“Não
é verdade que a inadimplência explique os altos juros cobrados no
Brasil, conforme argumentam os bancos”, ressaltou Igor Britto. “Nos
últimos
dez anos, os índices de inadimplência se mantém estáveis, com tendência
de redução, enquanto as taxas praticadas pelo sistema financeiro
continuam elevadíssimas”, completou o advogado do Idec.
DIVERSIFICAÇÃO
– A abertura do mercado para as chamadas “fintechs” – empresas do ramo
de tecnologia que atuam no sistema financeiro, a exemplo do Nubank
– como também a ampliação das modalidades de concessão de crédito (por
meio de fundos de investimentos, por exemplo) e de pagamento (via boleto
registrado) foram defendidas, de forma unânime, durante a audiência
pública. “Com concorrência, não há jeito de
praticar preço abusivo. Pode perguntar ao dono do botequinho”, destacou
Paulo Solmucci, da Unecs.
Embora
reconheçam que determinadas medidas microeconômicas implementadas pelo
Banco Central (Bacen) poderão contribuir para a redução das taxas de
crédito – especialmente, por meio de recentes resoluções do Bacen
(4.655, 4.656 e 4.657), voltadas a regulamentar as fintechs e alinhar as
regras dos cartões às demais operações de crédito – os convidados à
audiência pública apontaram que os chamados “spreads
bancários” (margem de lucro dos bancos) são um dos principais vilões dos juros altos no país.
“Temos
percebido o esforço do Bacen; mas, as medidas executadas pelo governo
ainda não surtem efeito na prática, no bolso do consumidor”, disse
Henrique
Lian. Conforme pontuou o diretor da Proteste, estudo realizado pela
associação com 108 operadoras de cartão de crédito revelou que a taxa
média de juros praticada no Brasil (433% ao ano) é a segunda maior da
América Latina, ficando à frente de países como
Colômbia, Argentina e Paraguai. No Chile, o índice médio é de 43%.
REGULAÇÃO
– Educação financeira aos consumidores para se evitar o
superendividamento e melhor regulação do sistema financeiro também foram
defendidas
pelos especialistas. “O brasileiro precisa saber, de fato, o que são
juros. E entender o que, na prática, ele paga de taxas aos bancos”,
afirmou o economista Maurício Lima.
Para Igor Britto não se pode permitir que as regras para cheques especiais, por exemplo, sejam reguladas pela
Federação Brasileira de Bancos
(Febraban). “É preciso reduzir a liberdade das instituições em se
autorregular. É desta forma que elas ficam livres para oferecer crédito
com juros abusivos e que não poderão ser pagos pelos
consumidores”, afirmou o representante do Idec.
A
segunda audiência pública da CPI será realizada na próxima quarta-feira
(16), com a participação de empresas credenciadoras de cartão
de crédito. É o caso da Associação Brasileira das Empresas de Cartão de
Crédito e Serviços (Abecs) e de empresas como Cielo, Pagseguro, Rede e
Stone, entre outras.
NÚMEROS DO IDEC:
ü
Juros de cartão de crédito praticados por um banco privado:
Passou de 190%/ano (em 2008) para 421%/ano (em 2018)
ü
Uso de cartão rotativo:
Saltou de 14.136 usuários (em 2008) para 35.089 (em 2018) – aumento de 148%
ü
Maiores inadimplências:
·
33,2% - usuários de crédito
·
13,9% - usuários de cheque especial
·
16,1% - usuários com dívida renegociada
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