Corte aposenta juiz acusado de fraude com empréstimos
FREDERICO VASCONCELOS
DE SÃO PAULO
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região puniu com a aposentadoria
compulsória o juiz Moacir Ferreira Ramos no processo disciplinar sobre
contratos fictícios entre a Ajufer (Associação dos Juízes Federais da 1ª
Região), entidade que presidiu, e a Fundação Habitacional do Exército.
A punição a Ramos chegou dois anos após ele ter pedido aposentadoria por invalidez.
Magistrados tentam barrar perda de aposentadoria
Outros três ex-presidentes da Ajufer receberam punições mais brandas:
Hamilton de Sá Dantas e Solange Salgado receberam pena de censura, e
Charles Renaud Frazão de Moraes, de advertência.
Os quatro magistrados foram acusados pelo Ministério Público Federal de
usar de forma fraudulenta o nome de 157 juízes para desviar mais de R$
20 milhões da Fundação Habitacional do Exército no período em que
presidiram a Ajufer, de 2000 a 2009.
| Editoria de Arte/Folhapress |
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A FHE (Fundação Habitacional do Exército) é uma entidade privada ligada
ao Exército, mas que também oferece empréstimos a servidores de governos
e do Judiciário.
Entre 2000 e 2009 a Ajufer contratou 700 empréstimos com a FHE em nome
de juízes que não tinham conhecimento dessas operações. Em 2010, após
descobrir a fraude, a FHE cobrou da Ajufer uma dívida de R$ 21 milhões.
A decisão do TRF-1, tomada por maioria no final de junho, deverá
frustrar os juízes lesados. Em abril de 2011, temendo que o caso
"acabasse em pizza", um grupo de 20 magistrados entregou abaixo-assinado
à Corregedoria do TRF-1. Pediam "investigação célere", afirmando que
seus nomes foram utilizados "de forma irresponsável, temerária e
fraudulenta".
A
Folha revelou o desvio
em março de 2011. Entre os beneficiários há associados fantasmas.
Cheques da Ajufer foram descontados na boca do caixa e depositados em
outras contas para dificultar o rastreamento. Empréstimos a juízes foram
depositados em nome de construtoras, concessionárias e laranjas.
"Em 32 anos de magistratura nunca vi uma coisa tão séria", disse a então
corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon.
Segundo o procurador-chefe da Procuradoria Regional da República da 1ª
Região, Juliano Villa-Verde, a operação fraudulenta na Ajufer atingiu "o
sistema financeiro nacional, ao promover a captação de recursos da
poupança popular sem o devido controle oficial".
OUTRO LADO
O juiz Moacir Ferreira Ramos, ex-presidente da Ajufer, disse que
recorrerá da decisão, pois sofreu "extremo cerceamento de defesa":
"Nunca disse que não tinha responsabilidade. Assumo e estou pagando. Mas
o único culpado sou eu?", questionou.
Ele disse que todas as contas da Ajufer foram aprovadas pelo Conselho Fiscal.
Segundo ele, o tribunal não permitiu perícias nem a apresentação de
provas: "Eu nem sequer fui interrogado e não pude apresentar as minhas
alegações finais".
Ramos apontou vícios no processo: "O relator já tinha sido escolhido
antes de proclamada a abertura do processo". Disse que alegou a
suspeição de dois relatores, mas o pedido não foi julgado: "Em conluio,
eles fizeram decisões idênticas, para prejudicar meu direito de defesa".
"Fui uma vítima, fui enganada", disse a juíza Solange Salgado: "Assinei
contratos em confiança, mas houve liberação de dinheiro com contratos em
branco. Em alguns casos falsificaram minha assinatura". Ela disse que,
"na presidência, não tinha como saber os valores que foram liberados sem
contrato".
Segundo a magistrada, "o TRF-1 conseguiu separar quem atuou e quem foi
usado". A juíza afirmou que seus advogados vão avaliar se devem recorrer
da decisão.
A reportagem não conseguiu ouvir os juízes Hamilton de Sá Dantas e
Charles Renaud Frazão de Moraes, e a FHE. Nas várias vezes em que foi
consultada, a fundação do Exército não se manifestou.