É repórter especial da
Folha, especializada em saúde. Autora
de "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de
'Experimentos e Experimentações'.
Escreve às terças.
Acabo de voltar de uma conferência de jornalismo de saúde em Santa Clara
(Califórnia) e um dos assuntos mais instigantes discutidos por lá foi
sobre o consumo excessivo de álcool nos Estados Unidos, que aumentou
significativamente nos últimos anos, especialmente entre as mulheres.
O estudo, do Instituto de Metrologia da Saúde e Avaliação, da
Universidade de Washington, traz resultados bem parecidos com os de um
trabalho feito no Brasil pela Unifesp (Universidade Federal de São
Paulo).
Por lá, o consumo excessivo de álcool entre as americanas cresceu 17,2%
entre 2005 e 2012. Por aqui, as brasileiras também estão bebendo mais e
com mais frequência. Nos últimos seis anos, a proporção das que consomem
álcool de maneira excessiva aumentou 24%, passando de 15% para 18,5%
das brasileiras.
O que é beber muito para os cientistas? Há ao menos duas definições: o
consumo pesado, que se refere a uma média de mais de um drinque por dia
(para mulheres) ou dois drinques (para os homens). E o chamado "binge
drinking", definido como quatro ou mais drinques em uma ocasião (para as
mulheres) e cinco ou mais (para os homens).
A partir desse estudo, os EUA montaram um grande banco de dados em que é
possível pesquisar o comportamento de Estados e municípios americanos
sobre o consumo de álcool. É possível observar uma grande variação na
prevalência. Por exemplo, o consumo pesado variou de 2,4% no condado de
Hancock (Tennessee) para 22,4 % em Esmeralda County (Nevada). Já o
"binge drinking" variou de 5,9% em Madison County (Idaho) para 36% em
Menominee County (Wisconsin).
No Brasil, sabemos que o aumento do consumo excessivo entre as mulheres é
mais expressivo nas regiões Sul e Sudeste, e nas classes de maior poder
aquisitivo.
POR QUE?
Mas, afinal, por que as mulheres estão bebendo mais? Há várias
hipóteses, na opinião dos pesquisadores. A começar pelo fato de que a
melhora da situação financeira da mulher faz com que ela saia mais para
beber com amigos. A mulher que bebe é vista como boa companhia, liberal,
moderna.
Há também as que buscam no álcool uma válvula de escape para enfrentar
altas cargas de responsabilidades e cobranças. Passam a ter nos efeitos
ansiolíticos do álcool um antídoto contra os sofrimentos, as angústias e
as frustrações.
O que muita gente não sabe ou prefere esquecer é que o álcool gera uma
euforia no início, mas é agente depressor do sistema nervoso central e,
em quantidades exageradas, causa depressões.
No organismo da mulher, o álcool tem efeitos ainda mais devastadores do
que no homem. Pesquisas realizadas na Faculdade de Medicina de
Greifswald, na Alemanha, comprovaram que a taxa de mortalidade entre
mulheres alcoólatras é 4,6 vezes maior que a das não alcoólatras. No
caso dos homens, alcoólatras morrem 1,9 vez mais que os sóbrios.
CUSTOS
Os EUA já colocaram na ponta do lápis os custos do uso abusivo de
álcool: mais de 70% dos gastos é atribuído à perda de produtividade (US$
134,2 bilhões), incluindo perdas decorrentes de doenças relacionadas a
esse uso (US$ 87,6 bilhões), morte prematura (US$ 36,5 bilhões) e crimes
(US$ 10,1 bilhões).
O restante dos custos incluiu gastos com a saúde (US$ 26,3 bilhões),
assim como gastos administrativos e de propriedade relacionados a
acidentes automobilísticos (US$ 15,7 bilhões) e gastos com a Justiça
(US$ 6,3 bilhões).
Desconheço estudos semelhantes por aqui, mas dá para ter uma ideia da
quantidade de dinheiro que estamos jogando no ralo. Cabe ao poder
público e a sociedade civil a divulgação de campanhas de prevenção e de
informações sobre os riscos do alcoolismo. As propagandas de TV com
gente jovem e bonita bebendo com entusiasmo certamente não estão
preocupadas com isso.