Argentinos elegem opositor Mauricio Macri para suceder Cristina Kirchner na Casa Rosada e põem fim a 12 anos de kirchnerismo
O candidato opositor Mauricio Macri, da coligação de centro-direita
Mudemos, foi eleito neste domingo (22) presidente da Argentina. Com
99,17% das seções eleitorais apuradas, ele vencia com 51,40% dos votos,
contra 48,60% do governista Daniel Scioli.
Por volta de 21h50 (22h50 em Brasília), o atual chefe de governo da
cidade de Buenos Aires começou seu primeiro discurso como presidente
eleito. Com lágrimas nos olhos, agradeceu os filhos e a mulher, Juliana
Awada, lembrou dos avós e dos pais e abraçou a secretária do pai, Anita,
que até hoje trabalha com ele.
"Vamos realizar uma mudança que é para o futuro, para uma nova época.
Essa mudança vai pedir toda a nossa energia, para construir a Argentina
que sonhamos, com pobreza zero."
Deu uma mensagem "aos irmãos da América Latina", dizendo que "quer
trabalhar com todos, e encontrar uma agenda de cooperação". Depois,
puxou o coro do "Sí, se puede" (sim, é possível) que o acompanhou
durante a campanha. Também enviou mensagem para "aqueles que não votaram
em mim", pedindo que se juntem ao esforço.
"Me ajudem a encontrar esse caminho. Esse país é um dos países do mundo
com mais espírito empreendedor, e a razão é que nossos avós e pais
cruzaram o oceano, sem Facebook nem Twitter e sem saber o que iam
encontrar. Eles construíram uma etapa maravilhosa do país."
Fez referência, assim, à trajetória do pai, empresário italiano que
chegou à Argentina nos anos 1940 e virou um dos homens mais ricos do
país. Ao final, pediu à Deus "que me ilumine para ajudar a cada
argentino". E pediu: "por favor não me abandonem".
O discurso de Macri ocorreu cerca de meia hora depois que Daniel Scioli
reconheceu sua derrota. Em discurso, ele afirmou ter ligado para Macri
para parabenizar o novo presidente argentino e desejou-lhe sorte em seus
quatro anos na Casa Rosada.
"Optou-se pela alternância. Optou-se pela mudança. Que Deus ilumine o
engenheiro Macri para que esta mudança seja superadora e importante para
este país", disse o candidato governista.
Em seguida, fez referência a programas do atual governo e agradeceu os
militantes de seu partido pelo apoio durante a campanha eleitoral e aos
mais de dez milhões de votos que teve.
"Deixamos o país com as taxas mais baixa de desemprego e de
endividamento. Uma Argentina de oportunidades, de cara para o futuro,
com a ciência e a tecnologia como política de Estado", afirmou. "Defendi
com muita convicção minhas ideias. Esperemos que Deus o ilumine [Macri]
para melhorar o que avançamos."
Depois do discurso de Macri, milhares de votantes começaram a comemorar
na região do Obelisco, em Buenos Aires. Eles eram menos numerosos que os
militantes de grupos kirchneristas que deixavam tristes a Praça de
Maio, perto do centro de campanha de Scioli.
Na primeira vez em que se disputou um segundo turno no país, Scioli e Macri concorreram em eleição acirrada. O governista
vencera o primeiro turno, em 25 de outubro, por margem de 37% a 34% de Macri. Em terceiro lugar
ficara o também peronista Sergio Massa (Frente Renovadora), ex-integrante do governo Cristina que correu por fora e teve 5 milhões de votos.
O novo presidente assume no dia 10 de dezembro, colocando fim à chamada
era Kirchner, iniciada em 2003, com Néstor Kirchner, e continuada por
Cristina em 2007.
Macri afirmou que levantará imediatamente as restrições para a compra de
dólares impostas pelo governo atual. Terá como tarefas iniciais o
combate a uma inflação estimada em 28%, a retomada do crescimento e a
criação de empregos formais, estagnados há quatro anos.
Sua principal dificuldade política será, porém, costurar alianças no
Congresso para viabilizar suas reformas. Tanto no Senado como na Câmara,
a maioria é kirchnerista. Macri se beneficiou de uma cisão dentro do
peronismo, que levou boa parte dos eleitores dessa corrente a o
escolherem no segundo turno, em protesto contra Cristina.
DIA DOS CANDIDATOS
Scioli foi o primeiro a votar,
em Tigre. Com a mulher e partidários, o governista foi cumprimentado
por uma pequena multidão com o grito de guerra: "se sente, se sente,
Scioli presidente", inspirado num tradicional canto peronista por Evita
Perón.
Ele pediu que os eleitores votassem "em defesa de seu futuro" e voltou a
citar o papa Francisco, argentino, pedindo que as pessoas escolhessem o
próximo presidente "com consciência".
Logo depois,
Macri votou em Palermo,
bairro nobre de Buenos Aires. Disse que sentia viver "um dia
histórico", e que, após a votação, iria jogar futebol com os amigos e
almoçar com os filhos, como costuma fazer aos domingos. Ele estava
acompanhado da mulher, Juliana Awada.
Já a presidente Cristina Kirchner votou em Río Gallegos, no sul do país.
Citou a pichação na Mansión Seré, centro de tortura da ditadura (leia
na pág. A9), defendendo medidas em defesa dos direitos humanos adotadas
por ela: "Nossa política de direitos humanos deixa a Argentina em local
privilegiado".
A presidente fez também um balanço positivo dos 12 anos de kirchnerismo,
o que motivou denúncias de que teria violado a lei eleitoral, que veta
pronunciamentos políticos na votação. Em menos de uma hora, ela lançou
mais de 20 tuítes autoelogiosos.
Em diferentes pontos de Buenos Aires, o clima variou. A escola infantil
número 5, no bairro do Retiro, em Buenos Aires, é a seção mais próxima
da Villa 31, favela perto de bairros abastados da capital. Foi uma das
poucas seções eleitorais de Buenos Aires onde Scioli venceu no primeiro
turno.
Débora Arce, 23, voltou a votar em Scioli neste domingo. Ela e a irmã
trabalham em um centro de reabilitação para usuários de droga na favela.
Para trabalhar duas vezes por semana, recebem 1.500 pesos (R$ 600) do
governo.
"Dizem que os programas sociais que incentivam o trabalho são para
vagabundos. Não é verdade. Eu trabalho e muitas outras pessoas que estão
comigo também", disse ela, defendendo os benefícios criados na gestão
de Cristina.
Já o cozinheiro Rubén Santiago, 62, também morador da Villa 31, optou
por Macri. "Não há trabalho nem segurança. Está ruim há muito tempo. Com
Macri será melhor", disse. "As pessoas não querem benefícios, querem
trabalho e salário digno".
A três quilômetros, na Recoleta, o aposentado Martín Peralta, 74, também votou no opositor. "É preciso mudar."
Eleitora de Scioli antes, a advogada Maria Babuena, 29, de Palermo,
votou em branco. "Se Cristina se candidatasse votaria nela", disse.