
O presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, está dormindo num colchão de ar, na embaixada brasileira em Tegucigalpa e seus apoiadores passsam por dificuldades. Há três dias os "colegas de quarto" de Zelaya não tomam banho, se barbeam ou trocam de roupa. A água, que chegou a ser cortada pelo governo de fato, é escassa e o jantar se limita a biscoitos ou arroz e feijão.
"Sobrevivemos alguns dias à base de biscoitos, uma alimentação muito irregular . Hoje (quinta-feira) devemos ter nossa primeira refeição normal", disse o diplomata brasileiro Francisco Rezende Catunda por telefone à BBC Brasil.
"Eu não me lavo ou troco de roupa desde que cheguei e durmo de roupa no chão", disse Milton Benitez, de 32 anos, à AP. Benitez é um escritor que diz não ter votado em Zelaya, mas veio apoiá-lo. Benitez disse que só conseguiu escovar os dentes uma vez, e mesmo assim com uma escova de dente que já tinha sido usada por outras nove pessoas.
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Tomar banho na embaixada é quase impossível, primeiro porque as autoridades cortaram o fornecimento de água e depois, quando o serviço foi restaurado, porque o tanque do edifício secou, disse Benitez. Na noite de quarta-feira, um caminhão para reabastecer o prédio foi mandado. "Nós estamos vivendo em condições desumanas", disse Benitez à AP.
Forças de segurança continuam cercando a embaixada, mas o governo interino disse que vai respeitar os pedidos do Brasil de não invadir a embaixada. No entanto, eles prometem que vão prender Zelaya assim que ele colocar o pé para fora do prédio.
De acordo com o presidente venezuelano, Hugo Chávez, aliado de Zelaya, a operação que trouxe o presidente deposto para Honduras foi secreta. Ele afirmou que Zelaya viajou de avião, no porta-malas de carros e em tratores, tudo isso com a ajuda de apoiadores, entre eles militares hondurenhos.
O líder venezuelano disse que Zelaya fingiu uma conversa ao telefone, para o caso de alguém estar ouvindo, em que discutia planos para comparecer à Assembleia Geral das Nações Unidas em Nova York. Segundo a AP, Zelaya chegou a viajar para El Salvador, onde encontrou, no domingo, com líderes esquerdistas do Partido Nacional da Liberação de Farabundo Marti, disse o presidente salvadorenho Mauricio Funes. Mas Funes, membro do partido e aliado de Zelaya, disse que seu governo não ajudou o presidente deposto a entrar em Honduras. Chávez se recusou a dar mais detalhes do plano.
"Eu sou o presidente que as pessoas elegeram e um país não tem dois presidentes", disse Zelaya em entrevista a uma rádio espanhola, por telefone. "Não pode haver paz quando um regime violento e ilegal domina em nosso país", afirmou.
Zelaya fala regularmente com seus apoiadores e pede a eles que fiquem "calmos e sejam pacientes", disse Benitez à AP. Mas as tensões são grandes: desde a primeira noite, há rumores de que soldados hondurenhos iriam atacar o prédio e prender Zelaya.
O número de pessoas na embaixada chegou a cerca de 300 na segunda-feira, segundo a AP, mas na quarta, aproximadamente 100 pessoas permaneciam no prédio, incluindo a mulher de Zelaya, Xiomara e vários ex-ministros dele.
Alguns dos ocupantes do prédio dizem que não notaram o intenso aroma do edifício porque as janelas ficam abertas durante o dia, e como diz Benitez, "todos estão na mesma situação".
As refeições consistem em biscoitos secos, água mineral, arroz, feijão e queijo trazidos por integrantes de movimentos de direitos humanos que têm acesso à embaixada. Mas os destinatários dizem que a comida é racionada e demora a chegar.
Na quarta-feira uma camionete negra entregou alimentos comprados pela família de Zelaya na embaixada brasileira. Entre os produtos estavam água, Coca-Cola, cereais, sanduíches e um liquidificador novo, segundo reportagem da Folha de S.Paulo.
Um jornalista que pegou uma sacola com comida trazida por um policial deu uma maçã a um amigo, que cuidadosamente cortou a fruta em duas para que durasse mais. "Não sabemos quando a próxima refeição vai chegar", disse Jorge Ramirez, de 25 anos, um estudante que está na embaixada.
Aparentemente, a situação está sendo cobrada de Zelaya também. Na quarta-feira os apoiadores dele se comprometeram a lutar pelo seu retorno ao poder.
Apesar dos desafios, o presidente deposto diz que não tem planos de deixar a embaixada. Ele repetidamente pediu para falar com o presidente interino Roberto Micheletti, que diz que esta disposto a conversas com a participação da Organização dos Estados Americanos.
Zelaya foi deposto em 28 de junho por militares hondurenhos sob a alegação de que ele infringia a Constituição ao tentar realizar uma consulta popular sobre mudanças constitucionais. Zelaya pretendia modificar a legislação para permitir a reeleição, o que é proibida pela Constituição de Honduras. O presidente deposto, cujo mandato termina no início do próximo ano, nega que pretendesse continuar no poder.
O presidente deposto, que retornou na segunda-feira (21) a Tegucigalpa em um movimento surpresa, recebeu autorização da chancelaria do Brasil para se abrigar na embaixada brasileira em Honduras. Toda embaixada possui status de território estrangeiro, e por isso a polícia e o exército hondurenhos não podem entrar no local sem autorização.
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