Um dia como outro

O jornalista Ricardo Palhano aniversariou ontem. Cheio de bom humor, cuidou de marcar a data com uma cronica onde explica porque não comemora a data. No Jornal O Estado, do qual é superintendente, Ricardo Palhano publicou...

Tem gente que adora aniversário. O Dorian, meu primo, é uma dessas pessoas. Ele costuma dizer que no seu aniversário é quando se sente mais feliz e importante, e dificilmente esquecemos a data, pois ele lembra, convida e comemora.

Já eu, quis o destino, inventei de nascer no mesmo dia em que minha mãe, a Dra. Wanda Palhano, aniversariava. Particularmente, sempre desconfiei da data, mas a Dra. jura que não houve arrumação, e garante que a minha chegada foi o maior presente que ela recebera de aniversário. O fato é que essa coincidência se tornaria fatal para a minha vontade comemorativa, já que sendo de menor importância, nunca, ou quase nunca, comemorava-se o meu aniversário. Era sempre o da Dra. E assim foi por toda minha infância e adolescência, levando-me a achar normal ser um homem sem aniversário. Com o passar do tempo, e a lista de amigos crescendo, casamento e a chegada dos filhos, começaram a exigir que eu comemorasse a minha troca de idade. Isso lá pelos 39 anos. Como já estava acostumado, e nunca tive muito jeito para essas coisas, sempre dispensei as comemorações, e na data, costumeiramente, arranjava uma viagem ou uma desculpa qualquer para driblar os mais entusiasmados e festivos que insistiam em ver-me apagando as velinhas.

Pois é, mas o tempo passa e a nossa resistência, não sei se pela idade, não fica lá tão resistente assim, e com tanta insistência e pedidos, comecei a pensar no assunto comemorativo, quando passei a prometer que no ano seguinte iria finalmente festejar meu aniversário. Ainda consegui enrolar alguns anos, mas, aos quarenta e nove anos, fui a obrigado a prometer, até mesmo a jurar, que no dia dos cinquenta anos faria uma grande festa. E assim ficou programado. Minha mulher, a Sandra, seis meses antes do dia dezoito de janeiro, começou a planejar a festa, distribuir tarefas e fazer a lista de convidados. Ia ter conjunto musical, cantor, DJ, e cada semana o local mudava, sempre por necessidade de um local maior, já que a lista de convidados aumentava a cada dia.

Aquilo começou a me preocupar. Primeiro, dada a minha timidez e, para falar a verdade, comecei a ter pesadelos imaginando quanto iria custar. Tentei negociar com a Sandra. Será que não seria melhor uma viagem à Europa dizia eu. Ela estava irredutível. Chamou o Dorian, o Chico e o Franzé, que também adora uma festa, e foi, batido o martelo. Não tinha como escapar; desta vez teria que comemorar meu aniversário.

Mas, mãe é mãe. Quando a Dra. tomou conhecimento da festa, que estava sendo planejada, chamou-me à sua sala e, protestando, disse que a festa não poderia ocorrer. Ela não iria permitir que eu fizesse cinquenta anos, pois algum engraçadinho poderia se atrever a fazer as contas e isso ela não poderia permitir. Agora era oficial: eu estava proibido oficialmente de comemorar o meu aniversário. De certa forma, foi bom, pois aos 100 anos de idade, morrerei com 49.


Ricardo Palhano é Superintendente do jornal O Estado

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