VERDADE SEJA DITA
MARLI GONÇALVES
De
quando em quando, ultimamente com uma frequência supersônica e
apavorante, surgem palavras ou expressões que são pisadas, repisadas,
espremidas, torturadas sem dó. Se elas vêm de outra língua ganham mais
status por aqui, uma roupagem “empoderada” para adentrar nossos salões
até que outras a substituam. A da vez é “fake news”, nada mais nem
diferente do que falar e usar “notícia falsa”. No fundo só ajuda o mais
novo esporte nacional: brigar por ideologias, estas sim, falsas até o
último fio de cabelo
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Mas
o problema que enfrentamos de verdade são as notícias verdadeiras, que
acabam escamoteadas em discussões estéreis, superficiais, insufladas por
vários lados muitas vezes de forma tão irresponsável que admira não
haver consequências legais e elas seguirem compartilhadas por milhares
de parvos e autômatos seguidores.
Como
se não se dessem conta de que vivemos no momento uma das mais graves
crises institucionais e éticas que o Brasil já passou, com o rompimento
dos liames entre todos os Poderes e de todos os poderes e instituições
com o povo. Seus representantes máximos brigam entre si publicamente
mais do que gato e rato. Declarações estapafúrdias se sucedem, e mesmo
discursos cheios de razão e palavras bonitas visivelmente surgem como
flechas com endereço certo, nem precisa ser muito atento para perceber
isso. Já não há mais qualquer liturgia, tanto no cargo como entre todas
as partes que deviam render algum respeito ou consideração.
Parece
que está mesmo difícil se dar conta de que temporadas e situações como
essa não costumam ter finais felizes, porque são roteiros voláteis. Os
dias passam e apenas as indisposições recrudescem.
Não
há graça nenhuma. Exceto, claro, num caso com uma pitada de humor
surreal em nosso vatapá, o da deputada que ia virar ministra, Cristiane
Brasil, que nos presenteou com aquele inacreditável vídeo feito al mare.
Se todos nós não tivéssemos visto e revisto diríamos que aquilo ali só
poderia ser notícia falsa, montagem, sacanagem de alguém. Ladeada por
quatro marmanjos de óculos escuros e peitos desnudos cuidadosamente
depilados, que até agora ninguém sabe exatamente quem são, a ministra-que-não-é
desfila, ao se defender, um rosário tal de sandices que só pioraram
ainda mais a situação. Nada me tira da cabeça que os quatro amigos
homens que ela juntou eram apenas uma tentativa de demonstrar que não
seria verdade o que à boca pequena e largos passos virtuais se fofoca
por aí nesse preconceituoso país machista e sexista. Que ela teria
mudado suas preferências sexuais.
Virou
a loucura da loucura, onde ninguém mais vai ter paz num país onde um
ministro do mais alto tribunal de Justiça, dentro de um avião, seja
xingado de um tudo e achincalhado. E isso seja aplaudido nas redes
sociais! Deselegância que vem vindo cada vez mais séria na polarização
política que deverá se agravar ainda mais em ano eleitoral.
Ninguém
precisa de notícias falsas em um tempo com tantas notícias bem reais.
Seguindo nessa toada o que ficará inviável e incompatível será manter a
sanidade e contas nas redes sociais, usar mecanismos como Whatsapp e
outros.
Será inviável retomarmos algum caminho em paz.
Não
só por causa de notícias falsas, que sempre existiram com seu nome em
bom português, mas por causa das pessoas falsas ocultas atrás de
teclados. E dos que andam apontando as câmeras de seus celulares não
para denunciar os malfeitos, mas para executá-los. Fazem isso sem
remorsos, com os celulares em pé, de lado, ou mesmo deitadinhos em seus
berços esplêndidos como tanto insistem.
Verdade seja dita. Verdade sempre aparece. Pode ser passageira. Pode ser só meia.
E a verdade também pode ser só um jogo de espelhos para esconder o que tanto se mentiu.
- Marli Gonçalves, jornalista - e a tal pós-verdade, como fica?
Fevereiro, 2018, país do Carnaval
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