Bom dia

Ressaca cívica de um dia a jamais ser esquecido


A vida muito pobre do interior cearense no início dos anos 60, do século passado, nas bodegas do sertão, não era de todo infelliz. O homem, que tinha ali seu salão de festa, seus encontros sociais, seus confissionários e até encontros para ligeiras trocas de olhares com mulheres-damas e moças donzelas, conseguia momentos alegres. Eram alegrias passageiras,como fantasmas em noites de solidão. A bebida era pouca como o dinheiro e os ganhos, daí ter que ser certeira, afiada, dura, forte, violenta. Pra afogar mágoas era ela, a bebida, a parceira e inimiga, a arma e o escudo. Uma em especial era definitiva; fazia rápido o efeito anestésico a que se propunha. Vinda do valente "rabo de galo", o "rabo de pavão" matava vermes, dores do corpo e da alma, enxugava e criava rios de lagrimas, abria intestinos presos, encerrava ciclos urinários dificultosos de próstatas degeneradas.
O "rabo de galo" era uma mistura de CACHAÇA, CONHAQUE DE ALCATRÃO E ZINEBRA. Era tiro e queda. O "rabo de pavão", porém era um canhão matando mosca. Como se recorda, mesmo as prateleiras mais tristes e desprovidas de itens diversos, tinha bebidas diferentes. Foi quando, num rasgo de dor, quem sabe uma imensa dor de corno, alguém o criou. Pegou um copo grande e botou lá;CACHAÇA, CONHAQUE DE ALCATRÃO, ZINEBRA, QUINADO, MOCORORÓ, VINAGRE, ÁGUA DE MANIPUEIRA, MOLHO DE PIMENTA MALAGUETA e coroou a desgraça com duas colheres de ÁGUA DO ALGUIDÁ que ficava debaixo do balcão pra lavar os copos. E bebeu.Bebeu e caiu duro. Acordou no dia seguinte crente que estava morto. Morto e no inferno. O que lhe zubiam os ouvidos, doia o corpo, os liquidos quentes e mal cheirosos a montante e a juzante do corpo machucado era algo elevado à infinitezimal potência do mal, porque o bem era como se jamais houvesse habitado aquele corpo. E junto a tudo, a ressaca era uma coisa inimaginavel. Ressaca física, ética, moral, educacional, cultural. Quem um dia viu isso ou soube disso,como EU, sente esta manhã a mesma coisa que aquela gente sentia diante de um copo de "RABO DE GALO"!. Depois do que vi ontem, o dia inteiro, pensando que o SENADO DA REPÚBLICA seria o ultimo bastião de homens e mulheres com alguma vergonha na cara, consegui acordar neste domingo, com o estomago em náuseas, o espírito devastado pela vergonha, a alma genuflexa pedindo ao PAI para tão cedo encontrar com colegas jornalistas, amigos que fiz ao redor do mundo. Quanta vergonha! Será que era isso que sentiam os homens tristes, das bodegas tristes, dos sertões tristes do Brasil? Se alguérm aí tiver condições de sobreviver à vergonha do vergonhoso senado da república do Brasil, que o faça; eu morrí até que uma dor maior me consuma e me mostre um rumo depois desses quase 60 anos de jornalismo. Deus não os desampare e permita que sobrevivam pelo menos as bodegas pobres e triste do interior.
Amém.

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