Brasil cede aos EUA, rompe tradição de 27 anos e não condena embargo a Cuba
Pela primeira vez em 27 anos, o Brasil cedeu às pressões dos EUA e
votou contra a resolução anual da ONU que condena o embargo econômico
americano a Cuba. Apenas Israel e Estados Unidos votaram da mesma
maneira que o Brasil. Nas últimas semanas, o governo americano, por meio da divisão de
Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado, pediu duas vezes que o
Itamaraty mudasse seu posicionamento histórico de rechaço a medidas
econômicas unilaterais e se alinhasse aos EUA na votação. AFPOs americanos argumentaram que, ao condenar o embargo contra Cuba, o
Brasil passaria a mensagem de que o país caribenho pode continuar
interferindo impunemente na Venezuela e que o governo brasileiro tolera
as violações de direitos humanos da ditadura cubana. Segundo os americanos, venezuelanos e cubanos já obtiveram uma
vitória com a eleição da Venezuela para o Conselho de Direitos Humanos
da ONU, em outubro, e o voto do Brasil seria outro trunfo internacional
para o regime hoje liderado por Miguel Díaz-Canel. O chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, cedeu às pressões americanas,
apesar de grande resistência do atual embaixador do Brasil na ONU,
Mauro Vieira. Mesmo países que têm relação muito próxima aos EUA e dependem
pesadamente de ajuda econômica americana resistiram às pressões de
Washington. A Colômbia e a Ucrânia, por exemplo, abstiveram-se na
votação. A Guatemala, único país a acompanhar os EUA e transferir sua embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, votou contra. No total, foram três votos contra a resolução, duas abstenções e
187 votos a favor do texto que condena o embargo americano imposto há 50
anos, no início da revolução promovida por Fidel Castro. A Moldávia não
votou. O voto brasileiro contraria o posicionamento histórico do
Itamaraty de condenar medidas unilaterais econômicas contra países,
vetadas pela legislação internacional e pela ONU. Em telegramas nos últimos meses, o embaixador Mauro Vieira tentou
argumentar que um voto a favor da resolução não representaria um sinal
de apoio à política de direitos humanos da ditadura cubana, mas sim uma
posição tradicional do governo brasileiro em relação à ingerência em
outros países. Também defendeu que um voto contrário não seria visto apenas como um
gesto contra o país, mas um posicionamento contra o princípio de não
interferência, o que desagradaria todos os países sujeitos a essas
medidas. Vieira ainda defendeu que um voto como esse poderia
prejudicar os interesses brasileiros -por exemplo, no caso da
possibilidade de sanções econômicas contra o Brasil devido à política
ambiental na Amazônia. Assim, o governo Bolsonaro teria dificuldade em angariar apoio de países contra esse tipo de interferência. Ao responder as argumentações de Vieira, as mensagens do gabinete do
chanceler Ernesto Araújo eram sempre secas, afirmando apenas que o
governo brasileiro manterá a instrução previamente passada. Vieira teria argumentado que, caso o Brasil quisesse mandar um sinal
ao regime cubano, poderia pedir a palavra durante o voto na sessão e
fazer uma declaração, deixando claro que o gesto não é um apoio a
violações de direitos humanos em Cuba. Por fim, o embaixador sugeriu que o Brasil se abstivesse em vez de
votar contra a resolução, porque não seria um movimento tão grave nem
isolaria o país. De novo, foi ignorado. “Sanções indiscriminadas como embargos afetam negativamente a
população em geral e, por isso, são consideradas já há anos uma medida
inadequada”, diz Camila Asano, coordenadora de programas da Conectas
Direitos Humanos. “A mudança de voto também preocupa por ser mais um exemplo do
alinhamento automático do Brasil com a política externa americana sem
que tais mudanças dramáticas sejam devidamente debatidas no Brasil, como
junto ao Congresso Nacional.”
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