Opinião


Diplomacia e bom-senso 


Mauro Santayana

Nossa vitória teria sido outra, se houvéssemos ouvido Caxias; mas o governo imperial, por estúpida decisão do monarca, substituiu o Pacificador pelo seu genro, para fazer, de um  príncipe europeu ocioso, o comandante supremo das tropas em operação. Daí o apequenamento da vitória, com a repressão supérflua contra a população civil e a perseguição e morte, em combate, do ditador paraguaio. Essa decisão caprichosa de Pedro II, em detrimento de homens como Caxias e Osório, criou-lhe uma oposição muda, mas poderosa, entre os militares — que acabaria na proclamação da República.
Ao longo de nossa vida republicana, procuramos dar aos nossos vizinhos derrotados tratamento preferencial, mas os ressentimentos perduraram. Os paraguaios, de um modo geral, viam, em nossos gestos amistosos, confissão de remorso, pelo comportamento do Conde d´Eu.

Foi assim o nosso caminho para a construção de Itaipu.  A represa poderia ter sido levantada a montante do Paraná, em pleno território brasileiro, embora com rendimento um pouco menor — mas, como estávamos no momento de euforia do governo militar, optou-se pelo projeto binacional, como novo marco nas relações com o país vizinho.
O resultado está aí. O novo presidente do Paraguai, Horácio Cartes,  recusa a readmissão de seu país no Mercosul, depois de ter sido temporariamente excluído em razão do golpe parlamentar que derrocou o presidente legítimo, Fernando Lugo.
O Paraguai, nos últimos meses, influenciado pela retórica antibrasileira do jornal ABC Color, e pelos golpistas do governo de Federico Franco,  tem tomado, sempre que pode, decisões que demonstram aberta hostilidade ao Brasil.
Foi assim quando o Paraguai votou, na eleição para a diretoria da OMC, no candidato mexicano ao cargo, Hermínio Blanco, contra o  brasileiro Roberto Azevedo, o que não impediu a vitória do Brasil. E isso, com mais de 10 votos de frente, em eleição que envolveu praticamente todas as nações do mundo — apesar da oposição de toda a União Europeia (com a honrosa exceção de Portugal) e dos Estados Unidos.
Também foi assim na eleição para a composição da Secretaria de Direitos Humanos da OEA, com a eleição de Paulo Vanuchi para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, sem o voto do Paraguai.
Ora, a Guerra do Paraguai caminha, já, para o seu sesquicentenário. Se, na Europa pensassem assim, não haveria União Europeia, e a maioria dos países do continente não teria relações diplomáticas com a Alemanha, devido aos crimes cometidos pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.
Para a construção de Itaipu, o maior projeto em seu território e obra emblemática da engenharia brasileira, o Paraguai só entrou  com terra e água, sem colocar  um centavo.
Mesmo assim, Lula aceitou dobrar o preço da energia fornecida ao Brasil, e nosso país constrói e financia, em território paraguaio, linha de transmissão que vai permitir acesso pleno à sua quota de energia da usina e à industrialização do país.
Se não fosse a receita de Itaipu, a soja e a revenda aos brasileiros de produtos importados em Ciudad del Leste, é difícil imaginar o que seria, hoje, a economia paraguaia. Mesmo assim, parte da elite paraguaia, influenciada pelo anticomunismo, acha que é melhor entrar para a Aliança do Pacífico do que permanecer no Mercosul. Ora, os números não mentem. O Paraguai envia mais de 90% do que exporta para o Mercosul e tem milhares de habitantes trabalhando na Argentina e no Brasil. Estará privado desse mercado, se o país deixar o Mercosul. E, mais, o porto de que se vale é o de Paranaguá, e todo seu sistema fluvial se dirige ao Atlântico, não ao Pacífico.
Para o Mercosul, a situação é inversa. O Paraguai não representa, hoje, nem 1% da economia do bloco. Seu PIB é menor que os 5 bilhões de dólares de superávit que o Brasil tem, todos os anos,  só com a Venezuela — o mais recente  membro dessa aliança.
O bom-senso acabará por prevalecer.

Mauro Santayana é jornalista, e meu amigo.

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