Quanto vale a Petrobras
Mauro Santayana
O adiamento
do balanço da Petrobras do terceiro trimestre do ano passado foi um equívoco
estratégico da direção da companhia, cada vez mais vulnerável à pressão que vem
recebendo de todos os lados, que deveria, desde o início do processo, ter
afirmado que só faria a baixa contábil dos eventuais prejuízos com a corrupção,
depois que eles tivessem, um a um, sua apuração concluída, com o avanço das
investigações.
A divulgação do balanço há poucos dias,
sem números que não deveriam ter sido prometidos, levou a nova queda no preço
das ações.
E, naturalmente, a novas reações iradas e estapafúrdias, com
mais especulação sobre qual seria o valor - subjetivo, sujeito a flutuação,
como o de toda empresa de capital aberto presente em bolsa - da Petrobras, e o
aumento dos ataques por parte dos que pretendem aproveitar o que está ocorrendo
para destruir a empresa - incluindo
hienas de outros países - vide as últimas idiotices do
Financial Times - que adorariam estraçalhar e dividir, entre baba e
dentes, os eventuais despojos de uma das maiores empresas petrolíferas do
mundo.
O que importa mais na Petrobras?
O valor das ações, espremido também por uma campanha que vai muito além da
intenção de sanear a empresa e combater eventuais casos de corrupção e que
inclui de apelos, nas redes sociais, para que consumidores deixem de abastecer
seus carros nos postos BR; à aberta torcida para que “ela quebre, para acabar
com o governo”; ou para que seja privatizada, de preferência, com a entrega de
seu controle para estrangeiros, para que se possa - como afirmou um internauta
- pagar um real por litro de gasolina, como nos EUA " ?
Para quem
investe em bolsa, o valor da Petrobras se mede em dólares, ou em reais, pela
cotação do momento, e muitos especuladores estão fazendo fortunas, dentro e
fora do Brasil, da noite para o dia, com a flutuação dos títulos derivada,
também, da campanha antinacional em curso, refletida no clima de
“terrorismo” e no desejo de "jogar
gasolina na fogueira", que tomou conta dos espaços mais conservadores -
para não dizer golpistas, fascistas, até mesmo por conivência - da internet.
Para os patriotas, e ainda os há, graças
a Deus, o que importa mais, na Petrobras, é seu valor intrínseco, simbólico,
permanente, e intangível, e o seu papel estratégico para o desenvolvimento e o
fortalecimento do Brasil.
Quanto vale a luta, a coragem, a
determinação, daqueles que, em nossa geração, foram para as ruas e para a
prisão, e apanharam de cassetete e bombas de gás, para exigir a criação de uma empresa
nacional voltada para a exploração de uma das maiores riquezas econômicas e
estratégicas da época, em um momento em que todos diziam que não havia petróleo
no Brasil, e que, se houvesse, não teríamos, atrasados e subdesenvolvidos que
“somos”, condições técnicas de explorá-lo ?
Quanto vale a formação, ao longo de
décadas, de uma equipe de 86.000 funcionários, trabalhadores, técnicos e
engenheiros, em um dos segmentos mais complexos da atuação humana?
Quanto vale a luta, o trabalho, a
coragem, a determinação daqueles, que, não tendo achado petróleo em grande
quantidade em terra, foram buscá-lo no mar, batendo sucessivos recordes de
poços mais profundos do planeta; criaram soluções, "know-how",
conhecimento; transformaram a Petrobras
na primeira referência no campo da exploração de petróleo a centenas, milhares
de metros de profundidade; a dezenas, centenas
de quilômetros da costa; e na mais premiada empresa da história da OTC -
Offshore Technology Conferences, o "Oscar" tecnológico da
exploração de petróleo em alto mar, que
se realiza a cada dois anos, na cidade de Houston, no Texas, nos Estados Unidos
?
Quanto vale a luta, a coragem, a
determinação, daqueles que, ao longo da história da maior empresa brasileira -
condição que ultrapassa em muito, seu eventual valor de "mercado" -
enfrentaram todas as ameaças à sua desnacionalização, incluindo a ignominiosa
tentativa de alterar seu nome, retirando-lhe a condição de brasileira, mudando-o para "Petrobrax", durante
a tragédia privatista e “entreguista” dos anos 1990 ?
Quanto vale uma companhia presente em 17
países, que provou o seu valor, na descoberta e exploração de óleo e gás, dos
campos do Oriente Médio ao Mar Cáspio,
da costa africana às águas norte-americanas do Golfo do México ?
Quanto
vale uma empresa que reuniu à sua volta, no Brasil, uma das maiores
estruturas do mundo em
Pesquisa e
Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, trazendo para cá os principais
laboratórios, fora de seus países de origem, de algumas das mais avançadas
empresas do planeta?
Por que enquanto virou moda - nas redes
sociais e fora da internet - mostrar
desprezo, ódio e descrédito pela Petrobras, as mais importantes empresas
mundiais de tecnologia seguem acreditando nela, e querem desenvolver e
desbravar, junto com a maior empresa brasileira, as novas fronteiras da
tecnologia de exploração de óleo e gás em águas profundas?
Por que em
novembro de 2014, há apenas pouco mais de três meses, portanto, a
General Electric inaugurou, no Rio de
Janeiro, com um investimento de 1 bilhão de reais, o seu Centro Global de
Inovação, junto a outras empresas que já trouxeram seus principais laboratórios
para perto da Petrobras, como a
BG, a
Schlumberger, a
Halliburton, a
FMC, a
Siemens, a
Baker Hughes,
a Tenaris
Confab, a
EMC2 a V&M e a
Statoil ?
Quanto vale o fato de a Petrobras ser a
maior empresa da América Latina, e a de maior lucro em 2013 - mais de 10
bilhões de dólares - enquanto a
PEMEX
mexicana, por exemplo, teve um prejuízo de mais de 12 bilhões de dólares no
mesmo período ?
Quanto vale o fato de a Petrobras ter
ultrapassado, no terceiro trimestre de 2014, a
EXXON norte-americana como a maior produtora de petróleo do mundo,
entre as maiores companhias petrolíferas mundiais de capital aberto ?
É preciso tomar cuidado com a desconstrução
artificial, rasteira, e odiosa, da Petrobras
e com a especulação com suas potenciais perdas no âmbito da corrupção,
especulação esta que não é apenas econômica, mas também política.
A PETROBRAS teve um faturamento de 305
bilhões de reais em 2013, investe mais de 100 bilhões de reais por ano, opera
uma frota de 326 navios, tem 35.000 quilômetros de dutos, mais de 17 bilhões de
barris em reservas, 15 refinarias e 134 plataformas de produção de gás e de
petróleo.
É óbvio que uma empresa de energia com
essa dimensão e complexidade, que, além dessas áreas, atua também com
termoeletricidade, biodiesel, fertilizantes e etanol, só poderia lançar em
balanço eventuais prejuízos com o desvio de recursos por corrupção, à medida
que esses desvios ou prejuízos fossem “quantificados” sem sombra de dúvida,
para depois ser - como diz o “mercado” - "precificados", um por um, e
não por atacado, com números aleatórios, multiplicados até quase o infinito,
como tem ocorrido até agora.
As cifras
estratosféricas (de 10 a dezenas de bilhões de reais), que contrastam com o
dinheiro efetivamente descoberto e
desviado para o exterior até agora, e enchem a boca de "analistas",
ao falar dos prejuízos, sem citar fatos ou documentos que as justifiquem,
lembram o caso do "Mensalão".
Naquela
época, adversários dos envolvidos cansaram-se de repetir, na imprensa e fora
dela, ao longo de meses a fio, tratar-se a denúncia de Roberto Jefferson,
depois de ter um apaniguado filmado roubando nos Correios, de o "maior
escândalo da história da República",
bordão esse que voltou a ser utilizado maciçamente, agora, no caso da
Petrobras.
Em dezembro
de 2014, um estudo feito pelo instituto Avante Brasil, que, com certeza não
defende a “situação”, levantou os 31 maiores escândalos de corrupção dos
últimos 20 anos.
Nesse
estudo, o “mensalão” - o nacional, não o “mineiro” - acabou ficando em
décimo-oitavo lugar no ranking, tendo envolvido menos da metade dos recursos
do “trensalão” tucano de São Paulo e uma parcela duzentas menor que a
cifra relacionada ao escândalo do Banestado, ocorrido durante o mandato de
Fernando Henrique Cardoso, que, em primeiríssimo lugar, envolveu, segundo o
levantamento, em valores atualizados, aproximadamente 60 bilhões de reais.
E ninguém, absolutamente ninguém, que
dizia ser o mensalão o maior dos escândalos da história do Brasil, tomou a
iniciativa de tocar, sequer, no tema - apesar do “doleiro” do caso Petrobras,
Alberto Youssef, ser o mesmo do caso Banestado - até agora.
Os
problemas derivados da queda da cotação do preço internacional do petróleo não
são de responsabilidade da Petrobras e afetam igualmente suas principais
concorrentes.
Eles advém
da decisão tomada pela Arábia Saudita de tentar quebrar a indústria de extração
de óleo de xisto nos Estados Unidos, aumentando a oferta saudita e diminuindo a
cotação do produto no mercado global.
Como o
petróleo extraído pela Petrobras destina-se à produção de combustíveis para o
próprio mercado brasileiro, que deve aumentar com a entrada em produção de
novas refinarias, como a Abreu e Lima;
ou para a “troca” por petróleo de outra graduação, com outros países, a empresa
deverá ser menos prejudicada por esse processo.
A produção
de petróleo da companhia está aumentando, e também as descobertas, que já somam
várias depois da eclosão do escândalo.
E, mesmo
que houvesse prejuízo - e não há - na extração de petróleo do pré-sal, que já
passa de 500.000 barris por dia, ainda assim valeria a pena para o país, pelo
efeito multiplicador das atividades da empresa, que garante, com a política de
conteúdo nacional mínimo, milhares de empregos qualificados na construção
naval, na indústria de equipamentos, na siderurgia, na metalurgia, na tecnologia.
A Petrobras
foi, é e será, com todos os seus problemas, um instrumento de fundamental
importância estratégica para o desenvolvimento nacional, e especialmente para
os estados onde tem maior atuação, como é o caso do Rio de Janeiro.
Em vez de
acabar com ela, como muitos gostariam, o que o Brasil precisaria é ter duas,
três, quatro, cinco Petrobras.
É
necessário punir os ladrões que a assaltaram ?
Ninguém
duvida disso.
Mas é
preciso lembrar, também, uma verdade cristalina.
A Petrobras
não é apenas uma empresa.
Ela é uma
Nação.
Um
conceito.
Uma
bandeira.
E por isso,
seu valor é tão grande, incomensurável, insubstituível.
Esta é a
crença que impulsiona os que a defendem.
E, sem
dúvida alguma, também, a abjeta motivação que está por trás dos canalhas que
pretendem destruí-la.
Mauro Santayana é jornalista e meu amigo